Há muito alarde na rua.
As luzes se acendem e se apagam.
Os homens passam de barba feita
e os calcanhares carregam confeitos.
Essa vida pouca
que se acha muita.
Surgem aqueles sempre incrédulos
foi não foi não foi não, capitão.
Barulho demais.
O martelar das flores já sem pétalas.
O reflexo pende para o lado direito,
na sua erudição de ser mais crédulo que o real.
O ganha-pão, ganha-franchising,
ganha-vida.
A carne que precisa de sempre mais carne
para jogar o seu truco.
Um vácuo enorme que se deixou
no peito das pessoas.
Aquele silêncio depois da bronca,
a criança reprimida e o pai ressentido.
Os sapatos estão descalços e inertes.
Os óculos estão sujos.
De noite os morcegos cantam,
de dia os pássaros segredam.
E o papagaio segue o coro
foi não foi não foi não, capitão.
O frenesi descabido habita os meandros da urbe,
espreita os transeuntes e engole os encautos.
Quem foi? Foi não.
O único que entende é o concreto,
mas a sua boca é um túmulo de lobo.
(os taciturnos nunca transgridem, submergem).
Todos afobados.
Homens sobre homens sobram homens sobre saias.
Todos afogados.
Malas, maletas, pernas, peles, deslumbramento, ignotos. Faixas.
Há muito que já não se sabe mais.
Consultam-se os alfarrábios e a verdade descortina-se:
nunca se soube. Choque. Comoção nacional.
Telejornais, revistas, tuíter, rádio, luz...
Jalecos tolos e incadescentes.
Livros caem de prateleiras.
Os sapatos continuam descalços
e os cabelos tornam-se grisalhos.
Boca seca seca. Bocejo.
Roupa amassada.
Alguma coisa
treme em qualquer momento da história.
O alarde, o barulho.
De longe, tudo de plástico, de brinquedo.
E o silêncio... De vidro.
Caio Mello
10/01/2012
terça-feira, 10 de janeiro de 2012
segunda-feira, 2 de janeiro de 2012
2012
Um homem
sentado em uma cadeira branca, apoiando seus cotovelos em uma mesa branca logo
a sua frente. Em cima da mesa, há uma folha de papel com o desenho de uma
árvore. O homem pega delicadamente a árvore desenhada pela raiz e a retira do
papel. A pequena planta emerge da folha, com todo seu frescor e com todo o seu
verde. O homem a segura com a palma de sua mão. Ele começa a falar:
“A maior virtude dos seres
humanos é a sua capacidade de sonhar. O sonho é que nos leva para frente. O
sonho é que nos faz acordar todos os dia de manhã, lutando contra o sono e
contra o frio, para seguir a rotina estafante do quotidiano. O sonho não deve
ser limitado, ele não deve ser contido, não deve ser debatido; cada indivíduo
possui um diferente. O sonho nunca aceita a realidade, ele é sempre sedento por
mudança, ele sempre busca o melhor. O sonho busca a perfeição sabendo que nunca
pode alcançá-la, pois o perfeito nada mais é que o limite do imperfeito. O
sonho nunca morre: se for bem cuidado, ele será passado adiante, atingirá
outras pessoas, terá filhos e netos e infindáveis gerações de descendentes que
manterão viva a chama do sonhador. Os sonhos não são mensuráveis, não são
sopesáveis, não são encontrados em qualquer canto. Os sonhos estão logo ali,
debaixo de nossos olhos, não são o inatingível. Os sonhos podem se dar ao luxo
de serem pequenos. Os sonhos não pertencem à realidade, não fazem parte daquilo
que chamamos de vida, mas, mesmo assim, eles existem. Os sonhos existem tanto
quanto existe o amor, tanto quanto existem as saudades, tanto quanto existe o
silêncio. Os sonhos tendem sempre ao infinito. Os sonhos das crianças são
feitos de descobertas. Os sonhos dos adultos são feitos de conquistas. Os
sonhos dos idosos são feitos de sinfonias. Os sonhos dão origem a tudo que
vivemos. Eles são as pessoas ainda mais do que elas mesmas. Os sonhos são os
olhos de quem não pode ver, os ouvidos de quem não pode escutar, as pernas de
quem não pode andar. Os sonhos são um abraço. Os sonhos são um poema. Os sonhos
são um filho. Os sonhos são um pai. Os sonhos são delicados como o vidro,
serenos como a chuva, afetuosos como os pequenos, intrigantes como a
descoberta. Os sonhos são uma carência que nos arde fundo no peito que nos volta
ao corpo a cada suspiro. Os sonhos devem ser cultivados, devem ser respeitados,
devem ser debatidos, devem ser construídos. Os sonhos, se perdidos, jamais
retomarão seu brilho inicial: o abandono causa marcas indeléveis no corpo. Por
isso, a cada raiar de um novo ano, a reflexão recai sobre cada um, sempre com a
pergunte já nas garras: conseguiste? E
o mais intrigante é que a própria resposta, além de enigmática, não deixa de
ser paradoxal. Se a resposta for negativa, a batalha foi incompleta. Se a
resposta for positiva, significa que a batalha foi grande o suficiente para
atingir as expectativas. Porém, se a batalha atingiu suas metas, por que foi
tão fácil? Os sonhos não têm fim. Será que os sonhos iniciais foram deixados de
lado para serem substituídos por uma vida mais simples? Ou será que a batalha,
na verdade, ainda está apenas no começo? É impressionante refletir sobre uma
indagação que, gerando duas respostas, leva a uma só conclusão: a batalha
continua.”
Caio Mello
02/01/2012
Assinar:
Postagens (Atom)