quinta-feira, 30 de junho de 2011

Yeah yeah yeah

E as linhas continuavam a se misturar num gozo suave que ia sambando conforme as tartarugas faziam curvas, brilhando ao céu da noite estrelada. No céu, enfim, não havia estrelas em abundância, mas dentro as milhões e milhões e milhões de estrelas faziam uma apresentação digna dos maiores teatros do mundo. Os russos ficariam estupefatos.
Love love love... O caminho parecia certeiro e os passageiros eram conduzidos pelo destino protegidos da brisa gélida que urrava do lado de fora.

It`s easy!

Tudo o que fora quadrado era agora esférico. Os homens pequenos escorregavam pelas bordas da esfera, sem achar mais quinas para ganharem sustentação. A bola era dourada. A outra era azul azul azul. Mas, junto com a laranja, já era agora passado. E do passado sobram alguns ecos somente. O que resta mesmo somos nós.

A noite dura de amor
E seus ponteiros correndo
Manchando vermelha cor
O que se vinha azuendo

Assim assim assim foi a terra se comendo. Comeu, passou fome e sede, sedentou a famigerada loucura de inanição. E de fome matou os homens. Com seus corpos mortos, montou uma fogueia enorme em noite de lua cheia. E rezou pra Lua pra que fizesse carne dos homens o piche. E fez-se o piche.

DO PICHE SE FEZ O ASFALTO
do piche se fez o asfalto
E foi de triste num assalto, de certo tão belo, que já nem de sofrer podia mais. A ironia da vida havia baixado sua acidez. Engraçado como as coisas mudam mas alguns calos permanecem. Ficou ali um resíduo. Algo nos olhos já conhecidos. Aquele mar sem fim de uma terra nunca dantes desbravada. Era tudo igual. A grisalhice escancarava as cicatrizes. Homem cicátrico. Com falhas horrendas perto do peito. Um coração a bater descompassado com a vida. Tum tum tum TUM tum tum TUM tum rum um nenhum.

O dinheiro nada compra
Dia voz passou vontade
Decisão ninguém foi contra
Falta monetariedade

Mas os amigos conseguiram sua mesa com tudo. E o nome já dizia tudo. Tinha tudo mesmo em tudo. Torres enormes! De marfim, de babel, de parafina, de bolhas cadentes que flutuavam só por discórdia. Um gosto de medo suave batia de leve nas portas do palácio. Era um batido ritmado me deixentrar me deixentrar vou me ferrar me deixentrar estou sem ar e cadê vocês? Cadê? O gato comeu?

Gato era o desejo simples daquela noite. Um samba corria de fundo na sala. Jorge Ben Jor bio maravilhaaaa nós gostamos de você. Eu sou flaflá. As mãos e os pés foram se esquentando devagar. Abria-se a geladeira-mundo por demasiado tempo e a vida seguia rumo lá fora, para desespero dos que de dentro viam os fatos.

Atinge o ápice a loucura.
Seus versos desregrados
soltam os cabelos com força e fé
numa certeza de curvas maravilhosas.

As torres coloridas
soltavam banhos fantasmagóricos
que fascinavam até os olhos
mais céticos debaixo da geada inexorável.

Apesar de algumas ligações, inexorável foi fim. E derradeiro grito deu-se da brisa assim que passamos pela porta da macchina. As narinas cerradas pelo ranho. Uma sensação doce (porém com aquele tom amargo de chocolate com muito cacau) saltava pelas veias e fazia mares em peitos ignotos.
Talvez fosse esse mesmo o segredo das coisas.

Abriu-se tranquilo o portão pintado de preto.

Caio Mello
30/06/2011

terça-feira, 14 de junho de 2011

domingo, 12 de junho de 2011

Flocos de mamutes

O rato com pernadepau, peruca de cabelos brancos cacheados e trajes de nobreza entrou no recinto. Muitos mamutes permaneciam na plateia, irrequietos. Estava um clima tenso dentro da sala. Não era um sinal de respeito à Vossa Excelência, nem uma sobriedade de jogo de truco. Não. Era um momento difícil mesmo.

Rato pernadepau
tum tum tum
Rato pernadepau
mut mut mut
Rato rato rato
tum tum tum

O rato foi mancando até a sua grande e acolchoada cadeira. Silêncio, disse ele. O martelo estava pesado. Vossexcelência começou a falar:

Ó João, meu Joãozinho,
como vai esse caminho?
Como vei aqui parar?
Eu que sempre acreditei que você era um bom moço, de boa família, de bons grados, de bons modos, de bons ares, de boas moças. Mas não, não, NÃO! NÃO! Ai, estou ficando sem ar. Guardas! Abram a janela, por favor. Isso, melhor assim.


João estava sentado na mesa à frente ao rato pernadepau. Estava sério o garoto. Tinha traços fortes, barba cerrada e mãos algemadas à cadeira. Sentia no fundo do peito uma vontade indizível de gritar, de dizer ao rato que fosse ao inferno com sua peruca branca cheia de piolhos.

Você sabe qual a sua acusação, garoto?
Sabe?

Existe em nosso pulsante
uma série de engrenagens
que foi tu, seu meliante,
que fez umas afanagens.

Tu roubaste, tu furtaste
tu quiseste completar
tu deixaste só as hastes
do que era salutar.

Tu foi pouco, tu foi fraco
tu não foi assim tão forte
tu fincaste agora um marco
onde tu verás a morte.

Pergunte aqui aos mamutes:
Vós deixais ele viver?


Os mamutes não pareciam muito certos de sua resposta. João continuava ali sentado com as mãos amarradas. Como assim, culpado? Tudo o que tinha era uma pequena peça em seu bolso direito... Uma engrenagem circular. Mas, sim, havia furtado. Não lhe pertencia a engranagem. E peças assim fazem coisas funcionar, fazem homens viver, fazem mentes trabalhar e fazem bater corações. Corações. Ou melhor: coração.

Ó, rato. Eu não quero saber do seu papo. A coisa não é tão simples quanto parece. Você já teve fome, muita fome? Você já acordou desesperado no meio da noite, com dor de cabeça, sentindo seu estômago tão vazio que você não consegue sonhar? Sonhar, cara, sonhar. Eu não sonho mais. Só respiro. Sou carne velha, carne mal passada. Passada pelo tempo, por esses sentimentos excruciantes que eu tenho. Eles me prendem a cada fim de tarde, vedam meus olhos ao nascer do sol, me afogam toda vez que tento entrar no mar. Não foi culpa minha. Vocês vivem me falando que eu tenho outra opção. Falam que a sociedade vai resolver seus problemas, falam que cada ser consegue achar seu lugar no mundo. Bom, e o meu? E minha grande chance? Cadê? Eu dei um jeito.

UM JEITO?


O rato gritou muito alto, levantou sua mão para cima e abriu os dedos. O teto da sala alçou voo e sumiu. Uma neve fina começou a cair em cima dos presentes no tribunal. O sol brilhava oblíquo no findomundo.

Tu chamas isso de jeito? A tua imprudência, tua indiferença? Malfadada sina tenho eu de cuidar de espúrio como ti. Ó, céus. Ó, mares. Que já vivi tanto eu, hoje, deprimo-me com o mundo roto que se verte perante minhas vistas cansadas. Tu disseste que passa fome. Olha bem nos meus olhos. Se tens fome, eu sou comida. Devora-me o tempo, calcina-me o presto escorrer do tempo. A clepsidra banha seus segundos com meu sangue que se esvai. Sou pó.
Não me digas que não compreendo.
Já ganhei minhas marcas.
Porém, indelével mesmo só o tempo.
O resto é vento e se perdeu.
Jovem tolo, não gastes tão cedo
o que Deus lhe deu com tanto agrado.

João começou a tremer de frio. Não sabia mais o que falar. Não podia entregar a engrenagem de volta. Os mamutes pareciam indecisos ainda. Alguns dele se mexiam nas cadeiras, outros tentavam esconder a angústia jogando a longa trompa na frente do rosto.
O rato soltou um longo suspiro. Tamborilou os dedos em cima da mesa de madeira. Levantou um pedaço da peruca, coçou a cabeça. Ajeitou a peruca de novo. Cocçou o nariz. Ajeitou seus pelos do bigode. Ficou encarando João. Sacou um charuto de sua gaveta, agarrou um floco de neve e puxou a fumaça de leve com o canto da boca. Voltou a falar:

Você sabe que, nesse tribunal,
não há acusação.
É só eu, você e
nossos amigos gordinhos aqui do lado.

Não tem muito o que fazer, sabe?
Furto é furto, roubo é roubo.
Pelo menos você não matou ninguém
nem nada...

Um dos mamutes balançou a cabeça, quase acreditando no rato. Mas outro mamute sentia-se mais inquieto. Por que matar o garoto por tão pouco? É, mas as tradições diziam que era assim, né... Não era bom irritar os deuses. Mas quem disse que tradição precisa sempre ser igual? Quem disse que os deuses não queriam ver uma evolução de vez em quando? Mas evoluções não se dão desse jeito tão direto, duma vez só. Não. As coisas evoluem paulatinamente, pé ante pé. Esse negócio de sair correndo é coisa de estabanado. Melhor ir devagar e sempre. João exasperava-se.

Memutes, pelamordi Deus!
Cês têm que me ouvir alguma hora.
Pensa bem.

Uma vida vive só
corre solta escuridão
uma corda sem um nó
e se esquece num só não

O que se fazem meus dedos
já não tenho consciência.
Eu só vivo os meus medos
e não tenho paciência.

Pensem-se como um garoto
que já já vai balançar
e só mais um corpo morto
que essa forca vai levar.


Um dos mamutes levantou-se vagarosamente. Coçou sua barriga prazerosmente.

Vossexcelência...
Entenda bem.
O garoto.
É.

Entende?

Por obséquio.
Sim.
Me entende?


O rato fez uma cara de desconfiado. Colocou os pés em cima da mesa. Levantou o nariz em tom desafiador. Aquele bando de gordos estava ficando mole com o tempo... Fosse dez anos atrás, o garoto já teria virado presunto. Mas e se ele mesmo tivesse abrandado um pouco? E se ele mesmo já não tivesse mais tantos coelhos na cartola para tirar na hora certa? E se ele estivesse amolecendo com o tempo? Não podia. Era juiz. Juízes devem ser imparciais. Sentir era errar ali dentro. Um floco de neve caiu em cima de seu nariz.
Sim. Definitivamente estava ficando mais frouxo. A balança pendia para um lado. Agora que ele já estava ficando mais velho, lembrava-se de seus tempos quando novo. Ele podia olhar fundo nos olhos de João e ver a si mesmo nitidamente. Era um perfeito arquétipo de si mesmo no corpo de um humano. É, as coisas realmente estavam mudando... O mamute inclinou a cabeça, querendo acelerar a conclusão. O rato começou a discursar:

É, João, liberdade. Instinto selvagem, com certeza. Já sei que essa peça furtada não tem mais volta. Uma vez tirada, tem gente que nunca mais acha. Tente levar pra ela de volta, não suma no mundo assim tão fácil. Também não arranque tudo de uma vez só, senão você enjoa. e, por favor, não deixe nem o tempo, nem eu, nem os gordos trombudos te dizerem quando é que tem que acabar. Vai embora, vai.


As correntes caíram da mão de João.

Caio Mello
12/06/2011

quinta-feira, 9 de junho de 2011

A política da arte

“E, mesmo que optássemos por um tal alargamento de sentido, (...) teríamos de continuar a descrevê-lo como uma função de diversão. É esta a função mais nobre que atribuímos ao teatro.”

A citação acima é de Bertold Brecht, um dos autores mais conhecidos pela politização da sua arte. No entanto, em seu texto Pequeno Organon para o Teatro, defende o entretenimento como o escopo principal do teatro. Essa aparente contrariedade é apenas um reflexo do quão complexa é a relação da arte com a política.
Tal relação vem sendo discutida ao longo da evolução da história do teatro, pondo em choque as diferentes escolas artísticas. Essa situação já era verificada no embate ideológico entre o Realismo e o Romantismo. O conflito está fundado na grande diferença de concepções de seus autores sobre para que servia o teatro.
Os realistas pregavam o teatro de tese, que usava a resolução intelectual de conflitos para moralizar o espectador, essa tida como a obrigação social do autor. Machado de Assis, em sua fase jovem, ilustra essa ideia, afirmando ter o teatro como uma escola de costumes, como uma iniciativa de moral e de civilização.
Já os românticos buscavam atingir o espectador pelo canal do sensível, colocando em cena o homem em seus momentos de crise, mas não tentando mostrar o que seria certo e errado. Não cabe a eles definir o que o homem deve ser, mas sim mostrar o que ele realmente é. Acreditavam que essa é uma reflexão muito mais profunda sobre a própria definição de humanidade. Refletir o mundo é uma posição política.
Essa dicotomia seguiu adiante com as escolas posteriores. De um lado, o pensamento de base romântica era visto como alienado e sem preocupações sociais. De outro, os realistas eram acusados de usar o palco como um panfleto político que pouco tinha de entretenimento.
O extremismo do debate nunca levou a um consenso. É nesse contexto que surge um autor com a capacidade de romper o antagonismo de ideias já estipulado: Brecht.
O autor foi sagaz o suficiente para colocar no palco uma visão política explícita sem negligenciar o caráter lúdico. Afinal, como ele mesmo disse: “Tornando-o um mercado abastecedor de moral, não o faremos ascender a um plano superior; muito pelo contrário, o teatro deve justamente se precaver nesse caso, para não se degradar, o que certamente sucederá se não transformar o elemento moral em algo agradável, ou, melhor, susceptível de causar prazer aos sentidos.”
O espectador interessa-se, a princípio, pela fábula, a narrativa épica no palco. É por meio dela que a tese política se deixa transpassar. Brecht só consegue perdurar no tempo porque, além de trazer os problemas imediatos de uma sociedade pós-guerra, ilumina a discussão sobre a essência do ser humano nessas condições. Essa é a chave para o universalismo na arte.
A arte que não versa expressamente sobre posicionamentos políticos também é política. O fato de o espectador entrar em comunhão com o que ocorre no palco já o transforma. Essa transformação o faz ter um novo olhar sobre a o ser humano e a sociedade.

Encaixotar a arte como política ou apolítica é limitá-la. Dizer que uma suposta arte política é imediatamente superior às demais é subestimar a capacidade que a arte tem de transformar por outros meios. É como dizer que as pessoas não conseguem apreender através de seus sentidos. É dizer que uma melodia não transforma o estado de espírito de seu ouvinte.


O teatro brasileiro perde um ícone

Há pouco mais de um mês, morreu aos 85 anos em São Paulo um dos grandes nomes do teatro: José Renato Pécora, idealizador e fundador do Teatro de Arena. É considerado como um divisor de águas no ramo por introduzir o nacionalismo nos palcos.
O Teatro de Arena representa uma ruptura do conceito teatral com a eliminação de adereços e cenários com o intuito de manter o foco nos problemas sociais retratados.
Com o objetivo de nivelar espectador e ator, Zé Renato colocava em prática um teatro no qual a plateia rodeava um palco central. Esse formato tira a visão elitista dessa arte, pois fomenta o debate de ideias no âmbito público. O diretor dedicou sua vida a montagens que faziam com que o espectador reconhecesse no palco quem os oprimia na sociedade, dando-lhes ferramentas para lutar contra essa opressão.
Ao colocar a realidade imediata em evidência, Zé Renato acaba usando o teatro como um meio para se atingir um objetivo prático. O que, em tempos de efervescência social, como o da iminência da ditadura militar, tem um papel histórico extremamente relevante. Mais adiante, durante a ditadura, a função social da arte torna-se indispensável, pois, uma vez censurados os meios de comunicação, cabia aos artistas driblarem o sistema com sua criatividade. Entretanto, essa escolha tem um grande ônus. Tratar os problemas de certa sociedade em um determinado momento histórico, dispensando o caráter lúdico, torna a universalidade das obras quase impraticável.
É indiscutível a grandiosidade desse diretor, além de sequer mencionarmos seu trabalho como ator. Seu legado inclui várias opções, como o recente Doze Homens e Uma Sentença, tendo em seu repertório de montagens várias peças de Brecht. Entretanto, ao montar Gianfrancesco Guarnieri, optou por não seguir os ensinamentos do alemão, arcando com os riscos de se tornar efêmero. Isso é uma das prováveis razões para o fim do Teatro de Arena.


Ana Carolina Capozzi
Caio Mello

07 de Junho de 2011

Amar

A poesia é linda.
Ela está no detalhe das coisas.
Num canto de um sorriso.
Num dedo fechado.

Ela não precisa de muito para ser.
Nós é que somos egocêntricos
e desejamos tudo na vida.
Ela, não.

A poesia é suave,
é como uma manhã de sol
banhada por uma brisa fresca.
É um benquerer.

Ela vai fundo nos olhos bonitos
vai densa em almas recônditas
vai fácil no coração do poeta
que se apaixona pelas suas próprias palavras.

E também é ela tudo.
A todo momento.
É a poeira embaixo do forno
é o cotovelo ralado.

Também não precisa ser definada.
Não se mede por limites,
não se localiza numa dada época,
nem obriga conteúdos.

A poesia é liberdade.
É libertação.
É o estado máximo de infinito
que uma alma pode atingir.

A poesia embaralha a cabeça,
enguiça o coração,
fragiliza quem a escreve.
Ela é exigente.

Exige atenção.
Exige madrugadas perdidas em claro,
com aquele desejo absurdo de escrever,
mas a falta de um conteúdo para ser escrito.

O que? A lua? O céu? O Amor?
Ah, isso tudo já foi!
E depois? Mais é preciso!
Não podem haver limites...

A caneta, a tinta, o teclado, a tela...
O poeta nunca está em silêncio.
Sua mente também é imensidão,
é a essência das coisas.

A poesia é um ato de luta,
a busca da liberdade
contra o preconceito social
contra o próprio preconceito.

Ela vive encrustada na alma do poeta,
inunda o quotidiano.
Brotam árvores, desejos, cores,
flores, momentos antigos...

A poesia tem um gosto.
Cada palavra vai além de seu significado.
Cada conteúdo é deslimitado.
Ele não pode ter fim.

A semântica poética é alternativa.
As palavras são exatamente o que elas querem ser
no momento que desejarem.
Não se fecham em dicionários.

A poesia é um vício.
Mais que um desejo: obrigação.
É uma alegria indescritível
que sustenta vidas inteiras.

Caio Mello
09/06/2011

quarta-feira, 8 de junho de 2011

O leão bom bom

O leão bom bom
anda leão
O leão bom bom
anda leão

anda assim bem devagar
anda ainda meio rápido
que passa no vagar
O leão bom bom

passa a sua juba
o povo agradece
acena pras crianças
O leão bom bom

pense que pense
que bom bom bom
O leão bom bom
vai passandinho

passa perto do ninho
chega mais o minininho
O leão bom bom
dá um beijo na testa!

granharaúdos
o povo aplaudindo
O leão bom bom
e grama ali verdinha

péantepé sim
O leão bom bom
tem porte de rei
é o dono da lei

O leão bom bom
é bondoso com os amigos
e rugidoso com outros
e vem aqui passando

passando no ando
eu ando quando
até quando?
seu leão, té quando?

O leão bom bom
não tem pressa
é ele também
o senhor de todo tempo

foi o homem besta
que inventou o relógio
O leão bom bom
não liga pra isso, não

quem é sábio
é bom à beça
e nem que se peça
se dá de graça

O leão bom bom
escova os dentes
com a pasta da Colgate
e posa pra propaganda

sai pra balada
abraçado com o ganso
com o pato e o ronaldo
o marcos ficou em casa

O leão bom bom
namora todas as leoas
e de vez em quando
também namora

as gatinhas da cidade
O leão bom bom
é a flor da idade
o tronco de superman

o tórax definido de aço
o busto de júlio-cesar
e coração de mil
poetas tudo junto

O leão bom bom
já viveu muita coisa
nessa vida
e ganhou cicatrizes

toda mulecada sempre
quer passar o dedo
por cima das cicatrizes
O leão bom bom

não se preocupa
isso não dói nada, não
e a águas passadas
não movem moinhos

só afogam passarinhos
e esses é que deviam
aprender a nadar sozinhos
O leão bom bom

tenta ajudar a todos
os animais do mundo
da floresta do deserto
do saara da amazônia

da corrente de humboldt
do evangelho de jesus nosso senhor
O leão bom bom
é muito bom mesmo

é meu povo eu digo
queria ser desde pequenino
todo mundo queria ser que nem
O leão bom bom

Caio Mello
08/06/2011

terça-feira, 7 de junho de 2011

Tubo

O infinito é o meu amor.
O pra sempre eterno,
efêmero enclausurado
nos meandros do que sou.

Um facho ascendente de luz
me desliza pela garganta
e grito docemente
os prazeres da vida.

Deixo-me estar
no meio do campo de batalha.
Sempre estive.
E coroou-me a vida com os louros grisalhos.

A diversão é o objetivo,
o maravilhamento do espectador.
A obra-prima, obra-minha,
carne viva e jogo de olhar.

O vermelho, o roxo, o verde,
o azul e o preto.
Conexos, juntos,
a girar perante o sol.

Gira cataventando o querer
meu desejar de peito amplo.
A vida maravilhosa
explode perante minha vista.

Meus olhos toscos.
Esse óculos torto,
míope mil vezes.
Sujo nas bordas.

As gotas correm pelo vidro
como pequenos insetos
bonitos que brilham
com a cor dos faróis.

Muitos insetos caem no chão.
Outros, voam alto.
Alçar voo é fácil.
É uma questão de liberdade.

Liberto-me, enfim,
num ato de despir-me
das roupas rotas e toscas
que carreguei com meus preconceitos.

E, sem saber, gerei um diminutivo.
É simples atuar.
Difícil é interpretar personagens.
Na vida real, basta calar-se diversas vezes.

E rir quando riem os outros.
Riem demais.
E afetadamente.
Mas isso fica pra outro conto.

Caio Mello
07/06/2011

Objeto de análise

Ando louco.
Devora-me uma tentativa de definição,
sempre incompleta.

Parece-me que as bordas nunca estão certas
e, a cada noite,
a definição tranforma-se em novidade.

Esse delineamento que busco
sei ser impossível,
porém não posso abrir mão.

Pararam-me todas as outras palavras.
Calaram-se todos os outros verbos.
Já não penso.

Estou fraco, deserudito.
Meus olhos pesam hoje.
Não me vêm palavras à mente.

É só nisso que penso.
Como? Como? Como?
Quais vocábulos me serviriam agora?

Céu? Lua? Estrela? Lobo?
Deus? Dor? Imensidão?

Há tanto já dito
e, mesmo assim,
não me disseram nada.

Busquei no fundo da minha alma
a certeza que me coubesse.
Mas encontrei cicatrizes e calos.

Revirei um monte de colchões antigos
e encontrei aranhas recônditas.
Já carrego bastante coisa.

E o que carrego faz parte de minha definição agora.
O que defino altera-se a cada instante,
a cada suspiro, a cada sopro.

O sopro da vida, do barro ao homem.
Eu sou barro e bárbaro
e vou morrer barro.

Nem os meus sonhos mais possuem resposta
eles povoam-me com pássaros com estrelas
em seu estômago.

Mas ninguém me explica.
Ninguém define,
ninguém desmente.

No fundo, no fundo,
acho que sei por que não consigo
enquadrar uma só definição.

Na verdade, não quero definir.
Quero apenas ter mais tempo e mais desculpas
para pensar e nunca mais achar a volta.

Caio Mello
07/06/2011

Objeto de análise

Ando louco.
Devora-me uma tentativa de definição,
sempre incompleta.

Parece-me que as bordas nunca estão certas
e, a cada noite,
a definição tranforma-se em novidade.

Esse delineamento que busco
sei ser impossível,
porém não posso abrir mão.

Pararam-me todas as outras palavras.
Calaram-se todos os outros verbos.
Já não penso.

Estou fraco, deserudito.
Meus olhos pesam hoje.
Não me vêm palavras à mente.

É só nisso que penso.
Como? Como? Como?
Quais vocábulos me serviriam agora?

Céu? Lua? Estrela? Lobo?
Deus? Dor? Imensidão?

Há tanto já dito
e, mesmo assim,
não me disseram nada.

Busquei no fundo da minha alma
a certeza que me coubesse.
Mas encontrei cicatrizes e calos.

Revirei um monte de colchões antigos
e encontrei aranhas recônditas.
Já carrego bastante coisa.

E o que carrego faz parte de minha definição agora.
O que defino altera-se a cada instante,
a cada suspiro, a cada sopro.

O sopro da vida, do barro ao homem.
Eu sou barro e bárbaro
e vou morrer barro.

Nem os meus sonhos mais possuem resposta
eles povoam-me com pássaros com estrelas
em seu estômago.

Mas ninguém me explica.
Ninguém define,
ninguém desmente.

No fundo, no fundo,
acho que sei por que não consigo
enquadrar uma só definição.

Na verdade, não quero definir.
Quero apenas ter mais tempo e mais desculpas
para pensar e nunca mais achar a volta.

Caio Mello
07/06/2011

Objeto de análise

Ando louco.
Devora-me uma tentativa de definição,
sempre incompleta.

Parece-me que as bordas nunca estão certas
e, a cada noite,
a definição tranforma-se em novidade.

Esse delineamento que busco
sei ser impossível,
porém não posso abrir mão.

Pararam-me todas as outras palavras.
Calaram-se todos os outros verbos.
Já não penso.

Estou fraco, deserudito.
Meus olhos pesam hoje.
Não me vêm palavras à mente.

É só nisso que penso.
Como? Como? Como?
Quais vocábulos me serviriam agora?

Céu? Lua? Estrela? Lobo?
Deus? Dor? Imensidão?

Há tanto já dito
e, mesmo assim,
não me disseram nada.

Busquei no fundo da minha alma
a certeza que me coubesse.
Mas encontrei cicatrizes e calos.

Revirei um monte de colchões antigos
e encontrei aranhas recônditas.
Já carrego bastante coisa.

E o que carrego faz parte de minha definição agora.
O que defino altera-se a cada instante,
a cada suspiro, a cada sopro.

O sopro da vida, do barro ao homem.
Eu sou barro e bárbaro
e vou morrer barro.

Nem os meus sonhos mais possuem resposta
eles povoam-me com pássaros com estrelas
em seu estômago.

Mas ninguém me explica.
Ninguém define,
ninguém desmente.

No fundo, no fundo,
acho que sei por que não consigo
enquadrar uma só definição.

Na verdade, não quero definir.
Quero apenas ter mais tempo e mais desculpas
para pensar e nunca mais achar a volta.

Caio Mello
07/06/2011

domingo, 5 de junho de 2011

Emaranhado

É algo interrompido, desconexo. Não possui nem meio, nem fim. Apenas um começo. Um início deslumbrante e nunca acaba. Nunca mais. Essa sensação de infinito, de imensidão, de estrelas. Um pensar que subjuga as outras ideias, que impede nossa mente de fugir para onde desejam os tecidos.
Mas, também, é simples. Falho, com toda certeza. Bambo, amedrontado. São dois pés idênticos de uma pequena criança que arrisca seus passos iniciais. E será sempre um princípio. Vinte anos depois, ainda será um princípio. Terá junto aquela pele suave, aquele olhar brilhante, desejoso da vida.
É uma manhã de sol que brilha laranja, mas que ainda não fez despontar seu calor vindouro. Esse querer latente, sempre construtivo e nunca conclusivo. E o cheiro do orvalho faz-se doce aos ouvidos. Os troncos meandram-se, deslimitam,-se, retornam. Somos, sim, raízes invertidas.
Indelével, com certeza. Inegável também. E inconstante. Possessivo, delinquente, destemido, desmentido. Desejado bilateralmente, unilateralmente ou plurilateralmente. Concepção de asas abertas, desejosa de abarcar todos. É infame, cruel, sussurado ao pé dos loucos e ao abraço dos idosos.
É uma ode. Ou até uma elegia. É, ao mesmo tempo, o conteúdo perfeito para um soneto. Para infinitos sonetos, para a falta de lógica em suas definições. É a estupidez do homem tentando padronizar o intangível. Mas é impossível negá-lo! Não há como a poesia não encher-se dele, não compadecer-se dele, não subordinar-se a ele.
A poesia é inundada por ele. É o estofo macio do urso de pelúcia. Por caminhos nunca antes trilhados, pisamos nas pegadas de nossos antecessores. É verdadeiro somente quando falho. Quando cristal. Transparente, translúcido e ruboramente opaco. Pisca aos fins de semana.
Não é nada. Invenção do homem para vender mais chocolate nas datas festivas. Mero paliativo para não encararmos as mazelas sociais. Nem devia ser mais que isso. Já que é o mundo inteiro. É a poeira que se junta embaixo da cama por mais de um mês. É a mola quebrada que insiste em ranger. É o sorvete. É o cachecol. Parafusos também.
E a obrigação faz-se latente. Que me perdoem as colunas gregas. Erro, sei. Mas justifico-me pela condição humana na qual me encontro. Escuso-me nos meandros de meu próprio sangue. Limito-me apenas pela minha capacidade de escolher as palavras certas, pois liberto-me para dizer o que quero, como quero e quando quero. E, assim, as palavras abrem sorriso. Porque foi para exatamente isso que elas nasceram.

Caio Mello
05/06/2011