segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Rezes

Um potro
um vazio
e um outro. 

Bio

(de)Generation



Éramos mais fortes?
Mais alegres, mais felizes?
Tínhamos as cores dentro do peito
e a loucura da vida?

Talvez a inocência seja
o descaso com os detalhes.
Talvez os nossos medos
tenham galgado as escadas mais rápido do que nós.

E nossos olhos, estariam hoje imersos na poeira?
Seremos poeirsia também?
Se nossos corpos se gastarem e os sorrisos se perderem
e as amizades se diluírem no oceano da vida...

Seremos todos contra a maré?
O que sobrou de nós hoje?
De poucos anos e muitos, muitos sonhos.
O desejo de uma única vida.

Unidos pelo tempo? Por deveres?
Nossas almas num jogo de roda,
explodindo com as imensidões de todo o Universo
numa grande realidade-fênix.

Nós. Grandes laços da vida,
apertos do peito, da alma e do coração.
Nós. Uma saudade desdita de um viver tão curto,
tão possante. E tão grandioso.

Juntos, no mesmo berço. Semi-lúcidos,
recém-trazidos de vidas pregressas.
Enfim, largados em meio a um coquetel explosivo
de álcool, anomias, normas e felicidade.

Feliz a idade? O pós sedentarismo que encontraremos?
Ou somos agora a massa primordial redeslumbrada,
perdidos em nossas novas demandas? Exigências tantas!

Um absurdo. Um absurdo tremendo. Abuso de nós mesmos.
Restou algo de nós? Fiapos? Trapos? Velhas ideias
e estúpidos idealismos de uma geração.

Jovens, ainda. Mas quebrados por algo.
Rachados, talvez, por alguma visão pessimista
que insiste em não ver aquilo que poderíamos
chamar de cascata de corações.

Deixamos mesmo dividir aquilo que construímos?
Será que a terra há de comer minhas ideias comigo ainda em vida?
Posso eu simplesmente deixá-las ao chão e vê-las apodrecer?
As raízes são tantas, arraigado eu e meu corpo roto.

Um velho de olhos jovens, enquanto minha alma
consome-se na lama do inverso do mundo.
O avesso de mim, com as tripas roçando no piso sujo,
gritando junto com os moradores de rua do Centro da cidade.

A enigmática de onde viemos. Da lama ao caos.
Deglutimo-nos em distâncias mundiais. Continentes. Países.
Muros imensos de ideias avessas.

Sinto-me só. Estarei só, então? Por que tenho medo?
A paura é minha medula óssea, reproduzindo-se diariamente
e espirrando desespero em meu sangue.

Não sei se morro. Estico-me por dentro. Elástico desgastado.
Perco a capacidade de regeneração a cada dúvida que tenho.
Não encontro mais portas, nem janelas. As flores caem.

O jardim. As águas, todas elas. Correntes marítimas
e aquilo que se foi um dia. Aquilo que guardo, no peito.
Guardo no aconchego de meu coração de poeta
(que a classe se faz por amor e não aptidão)
todos os sonhos deste mundo.

Os meus e daqueles que amo.
Duvido dos meus, acredito nos outros.
Melhor deixar a poeira.
Ela sou eu. Somos nós, até a eternidade do próximo suspiro louco.

Caio Bio Mello
30/09/2013

sábado, 28 de setembro de 2013

Sobre a segunda desnecessidade do fim do mundo

Mas o mundo já acabou
e ninguém me disse?

Caio Bio Mello
Datado depois do fim de tudo 

Sobre a desnecessidade do fim do mundo

Querido mundo:
Nesse erro do peço,
do faço e do posso,
só te digo o desejo nosso.

Não passe o erro vosso
(ou nosso, já não sei mais)
nesse próximo passo.

Não cesse a carne em aço,
não vá-se enforcar em laço.
(nem mesmo se mate com balaço)
Porque o pintado palhaço do tempo,
com a nossa alegria graça,
ainda tem seu bom ponteiro de praça.
(e o seu nariz de borracha)

Espere, mundo. Espere. 
Espere que tudo passa! 

Caio Bio Mello
28/09/2013

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A fila de homens-cães



O homem-cão
O homem-cão
Os homens-cães
O homem-cão
A cadela-maria
O homem-cão
O homem-cão
O homem-cão
O homem-cão
O homem-cão
A cadela-maria
A cadela-maria
Os homens-cães
O homem-cão
O homem-cão
Os homens-cães
Os homens-cães
Os homens-cães
Os homens-cães
A cadela-maria
A cadela-maria
A cadela-maria
O homem-cão
O homem-cão
O homem-cão
Os homens-cães
A cadela-maria
A cadela-maria
A cadela-maria
O homem-cão
O homem-cão
A cadela-maria
Os homens-cães
O homem-cão
A cadela-maria
Os homens-cães
O homem-cão

Caio Bio Mello
26/09/2013

O homem-cão



O homem-cão.
Tal qual cachorro do mato,
sempre na gangorra da vida.

Nessa ideia de comunicar sem dizer,
latindo suas vontades
e lambendo os seus desejos.

O homem-cão.
Existência repentina entre um dever e outro
de quem corre atrás de bolas
arremessadas a esmo por seu dono.

O sinônimo de posse. Pertencimento.
O fim do repente, término das surpresas.
Raia o dia, comida. Gira em círculos.
Corre, corre, corre. Não diz nada.

Ao fim do dia, o retorno para a casinha.
Sem contestar. Quando faz tudo o que querem,
o homem-cão recebe um osso.

Que presente! A tripa antiga de algo que já teve vida.
O bicho rói o seu próprio conteúdo,
sem nunca rememorar aquilo que deveria ter sido.
Põe a língua para fora, num arfar inquieto.

Também a cadela-maria. Metódica.
De rabo empinado e pelos macios.
Nesse vai-e-vém na porta de casa,
ali perto do jardim.

O homem-cão não tem pudores.
Faz suas vergonhas todas nas ruas.
Mas ninguém se importa.
Os donos catam as fezes em pequenos sacos plásticos.

Muito bem, homem-cãozinho, muito bem!
O homem-cão, quando em casa,
sabe alegremente mijar no jardim.
No máximo, ele mija no jornal.

E o dono lhe presenteia com biscoitinhos
quando o serviço é bem feito.
Triste do homem-cão...
Ele é tão fiel!
Chora de saudades quando o dono sai de casa.

Mas o próprio amor do bicho também é condicionado.
Ele ama mais quem lhe dá comida.
Alimentando-o direito, tem-se o seu amor.
Uma simples troca de vontades.

O bicho também não fica muito contente com as roupas que deve usar.
Uma casaco muito feio que incomoda o corpo.
Mas o que fazer? Os donos assim o pedem...
E todos os homens-cães andam com a mesma roupa.

Todos eles com aquilo apertado no pescoço...
Sim, enrolado por cima da gola, espremendo a jugular,
há uma coleira. Forte.
Quanto mais arisco é o animal, mais forte deve ser a coleira.

O dono prende o homem-cão. Arrasta-o para coisas muito chatas.
As coisas mais chatas do mundo. Mas o bicho não sabe falar.
Nunca lhe ensinaram palavra alguma.
Nunca lhe deram ouvidos para ver o que diz.

E os homens-cães são claramente bestas!
Animais incontroláveis que repentinamente
podem causar inúmeros problemas.
Desde objetos quebrados em casa a acidentes na rua.

Os donos têm medo, claro. É preciso respeitar os bichos.
Eles possuem dentes afiados e mandíbulas possantes.
Poderiam esmagar o dono a qualquer momento.
Então, é melhor fazer com que amem.

Amando, não sofrem. Não sofrendo, não pensam.
Assim é melhor. É mais positivo que fiquem bem quietinhos.
Mudos, para dizer a verdade. Assim, vão fazer o que lhes é dito,
vão obedecer . E nunca vão contestar o seu dono.

Caio Bio Mello
26/09/2013

terça-feira, 24 de setembro de 2013

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Entero

Como
sem vontade.
Mas cago
com prazer.

Caio Bio Mello
23/09/2013

De trovões e raios

Os sonhos mais terríveis 
de um triste ser de olhos abertos. 
Os sonhos - dessonhos. 

Eu, sonhante, neste pesadelo vivo
com uma perna no mundo irreal
e a outra em minha cama. 

Perdido em meio a trovões. 
"Estás vivo?"
Retumba no fundo da galeria
das almas. 

Galhos secos se retorcem 
dentro de meu peito. 
A caatinga de um homem só.

Os meus sonhos me sonham.
Me devoram, me digerem.
Estou dilacerado, triste,
doido e doído. 

E, sem mesmo saber dos caminhos,
sigo numa tortuosa reta 
à busca do nada, do nada e do nada. 

Nada serei. Jamais serei. 
Uma presente existência desdita
num ridículo onirismo 
que nunca vai ter sentido algum. 

Aos pesadelos, então. 
Ao menos eles me são honestos. 
Dizem-me a verdade escancarada
que me queima os olhos e 
torra a alma. 

Eles me mostram a verdade 
que eu sempre soube,
mas que nunca aprendi a admitir. 

No mar das mariposas, enfim,
que me afoguem 
para meu cadáver 
nunca mais ser encontrado. 

Caio Bio Mello 
23/09/2013

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Ao chegar em casa depois do trabalho



O mundo desaba em frente ao meus olhos. Não posso fazer nada. Não posso reagir, não posso relutar, não posso deixar de perceber. Ele se desfaz. Aos poucos. Eu, tão simples como a terra, como o asfalto, como a mesa de centro da sala de estar, sinto-me cansado. Mas, dessa vez, é uma sensação boa. A vida feita por etapas. Sento-me na beirada da minha cama. Tiro os sapatos. A camisa social. Sinto a minha humanidade correndo por mim. Então largo-me na minha mais completa loucura. Minha insanidade da carne, da alma, do corpo inteiro. Ali, perdido. Como se a vida não tivesse qualquer propósito, nem razão para ter realmente um propósito. Presto atenção em mim mesmo. Aos poucos, retiro o que me cobre. A realidade inteira, um mundo encoberto por mim. Jogo nas paredes de meu quarto o que sou. Enorme, não mais anatômico. Meus pensamentos borram a parede branca. Tiro de mim mais e mais partes, desmonto-me. Livre, sou. Uma existência tão real quanto deveria ser, um queremente de homem... Homem. Como o não definir daquilo que não existe para ser definido. O que não há, o que não se sente, o que já se sentiu e o que vamos sentir ao longo da nossa vida. Eu sinto, principalmente. Sinto os elefantes pairando no ar numa megamassa de existência recorrente. Sinto esse lado incrível das coisas não vistas. O metal de nossos ossos. A mente cheia de ideias, milhões delas. Perco-me em minhas ideias, perco o controle sobre tudo. Perco-me de mim mesmo. Sinto que já não tenho mais posse daquilo que poderia se dizer como posse. Como posso? Quem pode? Vou para a sala. Ao trazer-me de volta, afogo algo no fundo de um poço. O que não poderia ser mais escrito, o que não poderia mais fazer parte de algo que um dia será escrito. As palavras perdidas não devem ser mais resgatadas. Devem ser deixadas para trás. Elas existirão, com toda a certeza. Existirão dentro de mentes, entremontes e manadas e nós e nunca. Elas serão as palavras que quereríamos ser se não fôssemos o que somos agora. E eu diria... Algo em comum. Algo incomum. Mas não digo nada pela desnecessidade de se dizer alguma coisa. Penso. Logo mais, largar o que há de real no sonho. Atingir a verdadeira irrealidade. Ir além do real no imagético. Atingir o irreal no irreal. Finalmente alcançar algo que fuja completamente do padrão vigente de se enxergar as coisas. Vou matar minha consciência. Matar o que há de se limitar. Afogar meus preconceitos estúpidos, assassiná-los a sangue frio. Esquartejá-los para ser melhor. Esquecer minhas mãos, meus pés, tudo o que sou para ser o completo irreal. Então, a sala já nem sequer existe mais. Existe o sonho. Enorme. Gigantesco. Infinito.

Levanto-me e vou jantar.

Caio Bio Mello
20/09/2013