sábado, 7 de julho de 2018

Nas beiras

Dei início ao cômputo
            da alcateia.
Somei passos, patas e rosnados.
                        Antes que concluísse, desgarraram-me.
            Não fui são para saborear a carne que caçaram.

Solitário, então, rumei às praias.
            Categorizei os grãos por densidade, cor e polimento.
                        Perfilei-os, inclusive.
Súbito subiu a maré, desfez-me o cálculo.

Por empreender, cantei os pássaros.
                        De início, apenei-me e pensei que voava.
            Mas não. De chumbo, desabei.

Ao fundo do oceano, calculei cardumes.
            Segregava-os, seguia o fluxo.
                        Eram cem, mil, milhões.
            Todavia, enrijeci, desguelrado. A um novo continente arrastou-me a corrente.

Em terra, somei flores para um velório.
            Apertei meus beiços ao lagrimar.
            (só choram os que têm direito)
Senti que a saudade vencia.

 Calcei sapatos, costurei botões, almocei às pressas.
            Esgueirei na mescla multidão.
                        Expurgaram-me do coletivo abarrotado.

Trôpego e esfarrapado, mendiguei.
            Espalmei minha miséria, mas não aplacaram minha fome.
Ao revés: em minhas mãos, devolveram-me as minhas lascas
                        e passei a madrugada fria, sob o fito das estrelas urbanas,
no vão intuito de coser a pele, o sangue e os órgãos.
            Desamanheci morto.

Caio Bio Mello
07/07/2018