Um.
Dois. Três passos.
Sim.
Essa
era a distância exata.
Avoca
a cava
enquanto cavoca.
A
cabeça da pá submergindo repetidamente.
Um respiro a cada terra.
Mas
atenção! Há de limitar-se
à
profundeza do profano
o suficiente para encontrar o
humano.
Sim.
Bem rasinho. Dois palmos
(mas
foram tantos planos)
Algo
surge no meio da terra e dos gravetos.
Pequenos pontos
brancalgo(dão).
Ele
se ajoelha, como se bravejasse a reza.
Mas não há cristão, nem carpideira.
Hoje
não é dia do Senhor.
É
dia de festa.
Com
gestos delicados,
ele
vai desquebracabeçando o vulto.
Agora já se veem os braços, as
pernas, o tronco.
A
última etapa é emergir o rosto.
Ele sente o cheiro,
um misto de terra fresca
e saudades.
Desesparramada,
estava ela lá.
Parecia
exatamente como da última vez que haviam se visto.
(o efeito da saudade)
Ele
levanta uma pálpebra com o indicador e a outra com o polegar,
num gesto fugaz concomitante.
No
fundo de ambos os globos oculares,
já não existe o pretume (aquele de
costume).
Há
uma névoa cinza.
Tão cinza
e tão névoa
como se uma aranha fizera do olho
morada
e ali pitasse um fumo.
Oi, querida,
disse ele.
Caçou-a em seu colo, trazendo seu
rosto junto ao peito.
O
curioso é que, antes, ela parecia ser leve como pluma.
Agora, o peso era outro.
Mas não se comenta o peso
de uma mulher, pensou.
Abriu
a porta do carro, estacionado ao lado.
A vaga-luz interna do veículo varreu
a terra revirada.
Uma
cova reaberta, útero puerperal.
Sentou-a
no assento de passageiro.
Colocou o cinto de segurança
(todo cuidado é pouco
quando se ama).
Entrou
também no carro. Girou a chave e o motor pipocou.
Vem, meu amor, tem um bar
novo que quero muito te mostrar.
E
acelerou.
Caio
Bio Mello
16/01/2020