As crianças
Amontoam-se
Num canto da calçada
Pequenos pontos brancos
Deslizam pelo vento
Faz muito frio
O cinza das edificações
Fecha a vista
Há uma solitária listra amarela
Na faixa da ruela
E ele manca
Ele desliza sua perna coxa
E arrasta seu peso
Um conjunto profano
Ele é um sustenido
Na harmonia de dó maior
(O lá menor de
Sua incompletude)
Os membros de seu corpo
São desproporcionais
Mas ele persiste
Busca sempre um tom
De incólume
Como se fosse um fidalgo
Ao entregar à sua manquidão
Uma discrição sonora
O peito oscila
Num ar inconstante
Porém permanece
Como o último bastião
De sua própria sombra
As crianças se afastam
Têm medo de serem contagiadas
Tomadas pelo mal súbito
Que veio da carne ou da alma
Não sei
Mas que vergou aquele homem
Ele não desiste.
Ergue o queixo
O mancognata
Sem glória
Nem ostracismo
Sem medo nem apoio
Nem perdão
Ele vai
Pelo frio e pela neve
De cabeça erguida
E um orgulho indômito
De ser o que ele realmente é
Caio Bio Mello
05/10/2015
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