Ela caminha de um jeito sério, os ombros
arqueados e as pernas concatenadas. O rosto íntegro, bochechas rosadas e
redondas. O sorriso curto deixa a boca discreta nos breves momentos de
descontração.
O
corpo.
A
união entre a fúria animalesca e
o
prazer da carne.
Destroçá-la,
desfazê-la.
O
ato severo de puxar os cabelos,
colar
o rosto e ouvir o fôlego curto
próximo
às primeiras gotas de suor.
Eu
quero ouvir.
Os olhos são penetrantes, eles
invadem a minha alma perdida. [Eu sou mera perdição, descaminho, um pseudumano
se imiscuindo com o mundo, tentando provar para mim que existo] Não retruco,
não discordo. Ela me reprova, sempre. Discorda de meus atos, de minhas
posturas, de meu estilo de vida. Pré-piedade.
Que sabes da vida, poeta?
As
vigas, as dobras, armas do ferro
são
as curvas da moçarquitetura.
Ver
tal deliciosa criatura,
presa
no meio de um gemido berro.
Sentir
nos dedos a quente cintura...
O
ciclo de metal eu nela encerro,
quero
ter a carne, o resto desferro:
a
liga tem recôndita doçura.
Vou
desmontar, tirar os parafusos,
deixá-la
nua, vou sentir que existe
perto
da alma traço de humanidade.
Essa
mulher dentro de mim persiste
é
mais que desejo, é necessidade,
são
sonhos diversos, todos profusos. Ela está ali, séria. Os gestos calculistas.
Não se importa, nada é relevante.
Nada faz sentido, também não é
necessário.
É fato: o quotidiano
continua silencioso.
As
braçadas continuam as mesmas, os caminhos continuam iguais.
O estômago
ainda revira quando chega a fome.
Mas
eu não posso evitar. É natural. Uma atração maior que eu.
Quando se aproxima, vejo o mundo
paralelo,
aquilo
que existe dentro do existir.
Enquanto
isso, ela me reprova, ao servir-se de mais um copo da bebida laranja.
Caio
Bio Mello
26/03/2016