quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Metartropodofobia

A cada dia regrido mais
à condição de                                                                                                           larva
de rebento, de pré-nascimento.

Esse não é o meu momento,
é o silêncio que brota da carne,
o subterfúgio dos olhos cintilantes.
(mas não vejo mais como via antes)

Há essa ideia em minha cabeça,
uma mulher, com certeza uma mulher.
Um desregramento em mim de ser o que não sou.
Alguém que sem pegar, levou.

A larva. O verme. Desconheço-me.
Batem à porta da madrugada:
It’s me again. Antes fosse o corvo. Mas não é nada.

Sou eu perdendo peles. Camadas.
Eu já fui lenda, agora sou cinzas.
O                                                                                                                              esterco
mal lavado no chão do estábulo.

Uma vez limpei, continuou sujo.

Eu sou uma enorme mentira, uma farsa.
Regrido à carapaça perdida, estática e inútil,
da barata que rasteja pelos dejetos,
os banquetes prediletos.

A separação do lixo
compostagem dos meus órgãos
devorados por insetos
me transformarei em alma
fiquem longe do meu corpo
fiquem longe do meu corpo
Metartropodofobia
fiquem longe do meu corpo

Autópsia. Já nasci morto e
decrepito-me um pouco mais a cada segundo.
Só me resta este castelo, este buraco,
essa nesga de realidade.

Enterro meus dedos em algum corpo
não posso dizer se está vivo ou morto
um cadáver sem gestos, todo torto
vai me causando náusea, desconforto.
Existe alguma razão, talvez porto?

Mas não. A ideia morreu – mais um aborto.
Enterrei-a ao lado daquilo que gostaria de ter sido.
Algumas flores de plásticos mal posicionadas
ao lado do jazigo. Eterno silêncio, apagaram o fogo.

É uma escuridão que aumenta,
que doma progressivamente meus sentimentos,
dobra meus sorrisos e limita meu olhar.

Acromático. Dificilmente se ilumina.
Por trás do terno, o mesmo lunático.
O lince nasceu do pé da árvore e foi para a selva.
Livre, ele. Preso, eu.

Ou talvez seja aquele par de olhos,
a densidade do ferro. É muito pesado.
Durou segundos, milésimos, a dama,
o farfalhar da borboliberta. E foi só isso.

Entenderia? (questiono-me)

Assim, num átimo, capaz de devorar, refazer,
aproafundar. Estou no leito oceânico. Faz silêncio.
Estou, mas os olhos não estão. O ferro assim, próximo.

Não me resta nada.
A não ser                         morrer.

Caio Bio Mello
24/02/2016

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