quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O mosaico



Meus olhos secaram.
As cores sumiram.

O asfalto é muito duro.
Áspero como o concreto.

Conciso como a multidão.
Quieto como o silêncio.

O que há de crença em mim é o que sou.
Eu creio.

Mas sinto um abafado doce
do que foi um dia uma bossa.

As janelas não se abrem. Não podem ser abertas.
O mundo, lá fora, é estéril. Estático.

Um quadro pintado ao canto que, vez em nunca, se move.
Movo-me lentamente. Quase nunca.

O corpo tenso, fetal, umbilical.
O que restou, de fato, não é muito.

A vontade desconexa de manter a mente cheia.
Já não penso. Não, não penso.

Mesmo assim, mantenho a mente lotada com mil mariposas.
Fotos inúteis, informações inúteis, desenhos toscos.

Não vejo. Não como. Não falo. Não durmo.
Permaneço eternamente numa semivida.

Quase pleno. Quase ser. Como se batesse em meu peito um coração.
Uma máscara de oxigênio. Continuamente inebriado.

Perdido entre mil personalidades.
Todas incompletas, desgostosas de seu desempenho.

O mosaico do homem vestido de palhaço.
O lirismo dos clowns de Shakespeare.

Debaixo de tudo isso, debaixo de um homem lunático,
algo permanece inabalável.

Permanece intacta, viva. Dá-me liga ao viver.
A bandeira das madrugadas tranquilas.

Eterna e infinita, cá em meu peito,
alegra-me a poesia.

Caio Mello
19/09/2012

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