Faz-se saber que, a partir dessa
data, concede a Poesia os seguintes direitos e deveres a todos os seres
humanos:
1.
É lícito fazer pausa diária de uma hora nos
seguintes momentos: a) do primeiro raiar do tom da aurora até o sentimento de
ter o rosto aquecido pelo sol matinal b) do primeiro raio de luz que se perca
atrás do horizonte (seja ele de pedra, água ou sonho) até o derradeiro
adormecer do astro;
2.
Todo homem de guerra deverá também guerrar
contra sua própria tristeza, posto que a paz social inicia-se pela paz
individual;
3.
A alegria será sempre celebrada, sempre lembrada
por qualquer meio de veiculação possível. Seja através do contato físico, do
som, de imagens, de mensagens ou gestos;
4.
A vida será um bem eterno e solidário de todos.
Obrigam-se os demais pelo falecimento de cada um;
5.
O almoço jamais será refeição realizada
solitariamente. É vedado às pessoas comer às pressas, limitando-se a engolir o
que deveriam saborear;
6.
É lícito a cada um amar do jeito que entender
melhor. A título de lei complementar, o amor nunca poderá ser definido. O
conceito pode, simplesmente, ser respeitado e propalado. Cada indivíduo saberá
o seu próprio significado do termo;
7.
É lícito a todos tirar um dia de folga por mês
para visitar seus mortos. Para relembrá-los, para senti-los;
8.
O pranto deve ser respeitado, jamais tomado como
ato vexatório. É de direito comum o sentimento de perda, de incompletude;
9.
É proibido definir o conceito de felicidade. A
palavra não pode ser explicada com qualquer vinculação, seja relacionada com
bens de valor pecuniário ou não;
10. Haverá
um canal em rede nacional de monopólio de cada Estado. Nele, será obrigatória a
veiculação de imagens de todas as pessoas nascidas no país no mesmo dia. O nascimento
deverá ser celebrado;
11. É
lícito aos enfermos exigir, em seu velório, que haja celebrações de toda sorte.
Se assim for o desejo do indivíduo, haverá manisfestação de alegria e
contentamento em nome do celebrado. Todavia, é vedada a proibição do choro.
12. Às
crianças será concedido o direito irrestrito à imaginação. Será de obrigação
estatal o fornecimento de brinquedos a todos os menores de até cinco anos de
idade, respeitando-se na qualidade dos presentes o limites orçamentário de cada
região. O estímulo à liberdade será obrigatório;
13. Entrará
em vigor, a partir desta lei, revogando-se dispositivos em contrário, feriado
nacional no dia 1 de Janeiro no qual está vedado o trabalho. Estarão livres
para fazer o que bem entenderem os indivíduos, desde que respeitados os
direitos fundamentais e demais direitos de outros. Fica liberado o trabalho
solidário;
14. Em
relação ao feriado de 1 de Janeiro, é dever do Estado o estímulo à reflexão.
Deve-se, através de propagandas e cursos prévios, fomentar a ideia da vida, do
infinito, da imensidão e do estar-no-mundo;
15. A
cada pessoa será concedida propriedade de uma árvore, sendo de total
responsabilidade do indivíduo cuidar do bem-estar da planta. Independe a
espécie do vegetal;
16. O
mundo será de patrimônio coletivo e individual de todos os seres humanos, sendo
a fração individual uma ficção jurídica;
17. Todo
indivíduo é obrigado, diariamente, a reafirmar seu amor por seus queridos;
18. É
direito do cidadão e dever do Estado o combate ao ódio e à tristeza. Todavia,
se o indivíduo decidir isolar-se por conta própria, é vedado a qualquer um
impedi-lo de forma agressiva. Mensagens que tentem demovê-lo serão aceitas.
19. A
desistência infundada e inesperada será vedada;
20. A
perseverança deve ser louvada pelo seu conceito, pelo seu fruto e pela sua
origem.
Esta Carta deverá ser
interpretada através dos princípios da igualdade entre as pessoas, da defesa da
liberdade individual, do conceito bruto de sociedade e dos direitos
fundamentais da humanidade.
Caio Mello
20/11/2012