segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Lancinante



O vazio  e um silêncio desconexo
digladiam-se no espaço sideral.
As paredes vão ficando cada vez mais curtas,
cada vez mais estreitas.

O corredor é escuro.
No fundo, olhos estrábicos encaram o vácuo.
A vista de quem? (a vida de quem?)
A dor ausculta os corações partidos.

Cinza. Preto. Cinza. Cinza. Preto. Cinza.
Bolas de gude rolam sem controle.
Dentes rangem por detrás do armário.
Um choro seco é ouvido na esquina.

Mariposas perdem suas asas ao voar em direção ao poste.
Gatos pretos devoram os insetos.
As entranhas bipartidas inundam a noite.
O menino não gosta da cena.

O conjunto é frio.
Um corpo deformado se cria.
A carne putrefeita tem cheiro de vômito.
Ódio. Ódio de sim mesmo. Ódio do mundo.

Um desejo profano de se decepar.
Arrancar de si o pior de tudo.
Aquela porra de circo armado.
Infeliz palhaço de quem todos riem.

A graça é momentânea, mas a mácula é eterna.
O corpo não dura, não cheira nem cresce.
Morrer é fácil: basta largar o último sopro
nos ombros de quem ainda vive.

Ei-lo, frente ao mundo. Inútil.
Um falso. Fantoche esquálido em braços alheios,
fazendo a eterna dança do tu-que-ri.
Ri tu, ri tu, que eu não vou mais rir.

Todos se riem dele, todos o sufocam.
O cimento é muito quieto.
A água não dá trégua: inunda os pulmões.
Não há mais respostas.

Não há sequer lágrima para verter da face.
É ridículo.
As manias criam teias infinitas.
Os sonhos só são doces nos olhos.

Sonhar um sonho é fácil.
Difícil mesmo é contruí-lo,
erguê-lo do chão,
fazê-lo ganhar força e seguir firme.

A solidão, por vezes, invade a alma.
E as palavras entortam a vida, vergam a razão.
Os maníacos descendo o rio na barca-manicômio.
PALAVRASPALAVRASPALAVRASPALAVRAS

Ei-lo, novamente. Maldito personagem.
O terno envolvendo o defunto em seu leito de morte.
Aquele rosto pálido que paga contas todos os dias,
que monta relatórios e guarda as risadas.

O medo de tudo enquanto o corpo se esfacela.
Medo da vida, da morte, do emprego, do futuro, do passado...
Ao invés de diminuir, ele aumenta.
O corpo torna-se uma aberração.

Aberração, a vida.
Incongruente, nada mais se sustenta.
Como saber o verbo sem poder crê-lo?
Como, ao ver o primeiro raiar da aurora, seguir adiante? Adiantaria?

Sem mais respostas, as dúvidas criam raízes.
E o corpo se torna pó.

Caio Mello
04/02/2013


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