Cara, como eles querem que eu passe por aquele buraco estreito? Não é
possível. Não vai caber e não faz sentido. Poxa, eles podiam ter me avisado com
um pouco mais de antecedência. Faz só algumas horas que me falaram e o meu
mundo já virou de cabeça pra baixo! E eu que fiquei achando que as coisas iam
ficar assim pro resto da minha vida. Fui ludibriado!
Mas, quer saber?
Talvez eles estejam certos mesmo. É, sabe como as coisas são? Nem sim, nem não.
E aqui dentro já tava começando a ficar apertado mesmo. Só que tem um outro
lado... O que será que tem lá fora? Não sei nem se eu to querendo muito
descobrir. Como eu já falei: por mim, ficava tudo igual!
No começo, isso aqui
era um mundão! Sim! Vocês não fazem nem ideia. Parecia que eu tava nadando no
infinito! Era água e escuridão pra tudo quanto era lado! Cabia eu e quem mais
eu quisesse pra vir aqui. Se bem que... ninguém nunca veio – mas isso vocês não
precisam comentar com ninguém, né?
Ai! Que que foi isso
agora, meu Deus? Senti uma pressão no meu ombro esquerdo. Eu sei, eu sei!
Porra, será que ninguém me escuta? Eu já disse que vou embora, ou! Não precisa
ficar me empurrando. Véi, na boa... A coisa aqui tá ficando feia. Não quero nem
saber o que vai acontecer. Olha só o tamanho desse buraco, Minossinhora! Ave
Maria, não vai passar nem o meu dedo por ali. Dedo, olha que coisa legal. Dá
pra mexer e tals. Quantos será que eu tenho? Ai, de novo. Droga, não to vendo
porra nenhuma e não consigo abrir meus olhos aqui dentro.
Ai, ai! Ou! Para com
isso! Ta me entendendo? Para com isso! Senão vai ter briga aqui dentro. E o que
eu não gosto de ver é briga nessa vida! Onde já se viu. Eu já disse que ia
embora, me dá só mais uns minutos pra eu poder me preparar psicologicamente pra
isso.. Ave, buraco apertado. Meu Pai do Céu, me ajuda. Olha só pra essa
situação. Não é possível. Aposto que ninguém mais nesse planeta inteiro teve
que viver o que eu to vivendo agora. Eu sou muito azarado, é sério. Demais, além
da conta!
Eita! Agora ta ficando
mais forte. Eles tão empurrando minha cabeça para mais perto do buraco... Num
passa nem uma moeda ali. É bom abrirem um túnel aê que seja do tamanho dos da
Imigrantes. Já pensou? Eu me espremer todo pra passar aí? Isso vai contra os
direitos humanos, tão me ouvindo? Hein?! Eu mereço mais que isso. Qualquer um
merece mais que isso. Isso é ultrajante!
Opa. Minha bunda tá
pra cima. Olha isso. Eu to parecendo o Ispáider Mein aqui dentro. Minha vida
virou um circo. É sério, gente. Virou um circo mesmo. Me colocaram de cabeça
pra baixo, agora tão me empurrando. E o pior: eu já sei o próximo passo. Eu vou
sair por ali! Só pode ser. Quando te empurram numa direção e você não pode
fazer força pra outro lado, não tem jeito. Eu vou passar mal, eu vou passar
mal. Não to me sentindo bem. Alguém tem alguma coisa pra enjoo? Eu vou passar
mal. Nossa, sério. Alguém vai gastar uma grana com psicólogo no futuro pra
consertar isso. E não sou eu quem vai pagar. Joga nas costas de alguém.
Opa, alguém tá
falando. Eu consigo distinguir algumas vozes. Sim, essa mulher eu já conheço. Ela
deve morar aqui do lado. Vive falando um monte de lorota. Bla bla bla bla....
Mulher fala demais. Onde já se viu. E tem outra coisa que eu ainda não tinha
pensado: onde é que será que eu vou sair? Eu to pelado! E se for na Convenção Internacional
das Senhoras Católicas? Eu vou sair assim batendo as seis horas no sino da
igreja? Com tudo pra fora?
Ai, tá pior. Tá pior!
Aaaahh! Eu não consigo gritar, caramba. Não é possível. Isso não pode estar
acontecendo. Calma, cara, calma... Pensa em outra coisa. Se imagina em outro
lugar. Eu to na balada. Isso. Na balada. De boa. Com os amigos. A gente tá
tomando uma breja bem gelada e tudo tá de boa... Isso.
Ah, cara, não dá. Ai,
tá doendo agora. Virge, mãe santíssima, o buraco tá crescendo! É, mestre, eu
vou passar por lá. Aaaaahhhh! Óia que o meu cucuruto já tá sentindo o lado de
lá. Nossa, tá muito frio. Sério. Eu juro. De verdade, gente, me põe de volta!
Por favor. Já pensou se eu pego um resfriado? Cara, não quero nem imaginar.
Essas gripes doidas que o povo tá pegando hoje em dia. E se eu pegar uma gripe Influenza
e perder todo o meu feriado tomando
remédio? Eu não, cê tá maluco. Não quero isso pra mim.
Me põe de volta! Vai!
Não, não, não. Cês tão me empurrando pra fora de novo. Ai, agora acho que não tem
mais jeito. Vou ter que pular fora mesmo. Valeu, aê, seus bunda mole. É assim
que cês se despedem de um velho amigo? Ficamo junto tantos meses e daí... Me
chutam pra fora!
Nossa, véi! Véi, na
boa! To com a cabeça toda pra fora já. Mano, cê não vai acreditar! Tem um
maluco aqui com luva branca. Mano! Luva branca, mano! Eu não to vendo direito,
mas é sério. Ele deve tá doidão, não é possível. Jones, me deixa aê. Tá muito
frio aí fora. Nossa, tem uma galera aqui. Opa, ai. Sim, agora já foram os
braços. Falta pouco.
Mano do céu! Eu saí!
Olha o tamanho do buraco! E eu saí... Cara... Na boa, cês pegaram pesado
comigo. Tá frio... Tá muito claro. E eu não consigo respirar direito. Tudo tava
indo tão bem até que cês apareceram na minha vida. Quanto egoísmo, viu? Pera...
Que isso? Eu to cheio de sangue! Nossa... Não posso ver sangue. Não posso, não posso,
não posso. Tira isso de mim! Eu vou chorar, eu juro. Não aguento. Vocês
venceram, tá? To chorando. Felizes?
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Minha senhora, parabéns! É um menino!
Caio Bio Mello
01/06/2013
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