domingo, 21 de abril de 2013

(sem título)









AMOR
TE



Caio Mello
21/04/2013

Refeição



Você dorme.
Esse corpo inteiro
deitado na cama sem cobertas.

Suas curvas, sua carne macia...
Sim, muito macia.

Te corto em cubos bem pequenos.
E você dorme tranquila.

Um cheiro gostoso vem da cozinha.
Preparo tempeiros, esquento a água no fogão.
De acompanhamento, feijão e arroz.

Coloco delicadamente seus pedaços na panela.
Não deixo a carne passar do ponto. É preciso ser atencioso.

Eu te como no jantar. É muita carne. Tenra, suave.
Dá água na boca. Desmancha a cada dentada.

O banquete me deixa cheio.
Cansado e feliz, deito-me na cama.
E durmo.

Caio Mello
21/04/2013

domingo, 14 de abril de 2013

A luta do eu-mesmo



Quotidianamente, não nos conhecemos.
O zumbido monótono da vida
abafa nossa essência.

Os ternos, os carros, as taxas
cobrem nosso sentido de estar no mundo.
O corpo vazio preenche-se
facilmente com futilidades.

Não é nesse mundo que vivemos.
Não é nessa carapaça pueril que nos encontramos.
Não.
Vivemos mais fundo.

É na lama que existimos.
Conheceremos a nós mesmos
quando estivermos nus
e desprovidos de qualquer defesa.

Quando as amizades forem vergadas,
quando os ideais forem contestados,
quando o próprio amor nos trair,
então nos encontraremos.

Cara a cara. Na crueza da dúvida.
Seremos obrigados a suportar
a nossa própria carne,
a suportar o nosso próprio bafo.

Sem espelho. Sem perfume. Sem calçados.
Sem maquiagem. Sem charutos.
Sem aplausos. Sem apertos de mãos.
Sem nada.

No fétido silêncio da solidão
seremos obrigados a sobreviver.
Sim.

Na pocilga, lutaremos.
E somente os fortes conseguirão reerguer-se.
Somente os poderosos poderão fazer jus à vida.

O pior monstro do homem é ele mesmo.
A vida interior é um Universo íntimo, ínfimo e infinito,
no qual qualquer um é capaz de se afogar.
Um mar de dúvidas e memórias.

Nessa aventura minimalista,
seremos testados.
O corpo nos testa,
a mente nos testa.

A alma
condena.

A luta será pelo auto-conhecimento.
O interior sofrerá
no inverno da abjeção.
A própria mente selecionará os fortes.

E quem viver, verá.

Finalmente,
do caos
da guerra
da lama
e do ódio

brotará um novo indivíduo.
Consciente. Completo.
Coeso.


Caio Mello
14/04/2013

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Momento



A vida é um
teatro
                        maravilhoso
sem fim
                                   sem sentido
mas com gosto. Muito gosto.

Um sabor indescritível.
A língua imersa em madrugadas maravilhosas,
profundamente perdida no raiar das estrelas.

                        A mente
não lúcida
perdida
                                   eufórica
alegre por ir
                        alegre por existir
alegre por desinibir.

Tudo se encaixa. As engrenagens mesclam-se
            Tudo tem fim. Tudo precisa
                        ser.
Ser. É tudo.               
            O que não se explica, nem merece significado.
A existência pelo seu próprio âmago,
                                                           as entranhas das estrelas.
O sangue pulsante de uma mente perdida.

Eu vejo. Olho e vejo. Enxergo o mundo de uma só vez.
                                   E ele é fantástico.
Radiante.                                Tão gigante.
Tão gigante
            que já não consigo descrever.
                        Abdicarei de só (r) ver.
E serei o claro, misterioso e carnal vi
                                                           ver.

Caio Mello
08/04/2013

domingo, 7 de abril de 2013

Abafem-me



Os limites entre a vida e o sonho
estão cada vez mais tênues.
Não sei mais se faço viagens abstratas
ou se o concreto me é palatável.

Estou me corroendo, me desfazendo.
Perdendo em mim o que há de ser.
As subjetividades multiplicam-se, somam-se,
e eu permaneço estilhaçado.

Ich bin grau.
Ich habe keine Farbe,
die ich liebe.
Meine Gefühl ist dunkel.

Há livros velhos na estante
que se desfazem com o tempo.
A terra há de comer, o verbo há de comer,
o sentimento será devorado

e somente as traças terão em seu bojo
a tristeza versada numa tarde pequena.
Desconheço-me
 a cada dia mais.

Io ho dimenticato la gioventù,
io sono qualcos’altro.
E la notte non ha
più luce per me.

I see myself as a distant friend
who I haven’t seen for quite a while.
Is he real? Am I a mirror?
Maybe my verses are nothing but a stupid joke.

I am a lyrical clown,
drowned in makeup
and lost in a dream,
the infinite, endless and maze shaped dream.

Life’s and endless maze.

Os caminhos bifurcam-se.
Dentro de mim, as veias fagocitam a carne,
diluem meus sentidos e
carregam enlouquecimentos.

O corpo padece, a mente perece.
Saber não é mais uma constatação.
É uma viagem hipersensorial,
diversas vezes desagradável.

Ich sehe zu viel.
Sehen tut mir weh.

Eu só gostaria de carregar essa doença a menos,
gostaria de poder contorná-la, externá-la como um traço.
A mera característica, um reflexo banal
como uma pinta ou uma cicatriz.

But my body is my living proof.
And my mind is my unliving standard.

Ninguém sabe de fato o que ocorre por detrás dos olhos de vidro.
Ninguém jamais viu, ninguém jamais conheceu.
E o frio recôndito jamais será partilhado,
sofrendo o coração em seu inverno sem fim.

A pele se rasga, se desdobra.
A mente parte-se em múltiplas e se cansa.
Ich bin müde. Kopf(welt)schmerzen.

Enterrem-me. Por favor.
Preguem a caixa de madeira e sufoquem meu último suspiro.
Deixem-no abafado debaixo da terra
e tenham a decência de nunca chamar por mim.

Caio Mello
07/04/2013