domingo, 12 de setembro de 2010

Contrapeso

Ele aperta o botão, que torna-se vermelho.
Parado, espera. Bate o pé, tem pressa (todos têm).
A porta se abre. Ele entra. Fecha.
Dentro da caixa, aperta mais um botão e ascende.

A caixa de ferro solta um zumbido queixoso e depois um estalo.
Ele está cansado, o dia foi longo.
Uma parada antes do desejado.
Alguém entra, uma mulher jovem.

O substantivo mulher é tudo o que ele sabe, nada mais.
Ele já vira diversas vezes a moça (bonita!),
ela também mora ali.
Mesmo assim, dela nada sabia (para que saberia?).

Nossa, hoje o dia está quente... Começa ela
É... Parece que amanhã vai chover... Ele retruca, polidíssimo.
........... A caixa para de novo.
Deixando um até logo, sai a bela moça rebolando.

Ele suspira longamente. Estende os braços, espreguiçado.
Repreende-se pelo ato, a câmera dentro da redoma
de vidro fosco o vigia,
só Deus quem o vê.

A câmera olha sempre de soslaio,
sempre irritando e nunca claramente perceptível.
Ele decide encará-la, enfim constatando que
engrenagens não se intimidam assim tão fácil.

O porteiro gordinho deve saber muito da intimidade
dos moradores. Ele possui um olho mágico.
Por que viver tão alto?
Ainda falta uma boa subida.

Ele olha para o relógio.
Para que olhar? Ele já sabe de antemão o horário.
Porém, o vício o subjuga.
Libera mais um longo suspiro.

Outra para inusitada, mas que falta de sorte!
Um senhor manca lentamente
enquanto ele detém educamente a porta.
Fecha-se a porta.

O velho parece resolutamente calado.
Ele nunca vira o velho ali,
não poderia morar ali.
Admitiu para si próprio que não conhecia todos os moradores.

A porta abre-se finalmente para seu destino.
Ele desce da caixa, ela oscila ligeiramente.
Despede-se do velho maquinalmente.
O metal segue rumo.

Tateia a calça, em busca de chaves.
Enfim, em casa.

Caio Mello
17/07/2008

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