segunda-feira, 19 de março de 2012

Brilhantismo


Eis que o sol desponta seus primeiros raios
em mais uma manhã.
Entrecortado, sem jeito por detrás dos
arranha-céus,
surge o persistente vulto do astro.

E o homem de coração partido,
que viu sua mulher partir,
sente na ponta de seus pés o primeiro calor matutino.
Abre forçosamente os olhos ainda inchados.
Com o acordar vem ao peito toda a tristeza
que o sonho havia levado.
Mas ele sente a força da manhã.
Infla-se por dentro com o estofo
de algodão que também pertence aos elefantes. E se levanta.

O senhor de noventa e cinco anos de idade
abre os olhos extasiado. Ainda está vivo!
Por quantos dias poderá ainda sentir o calor
dos pequenos fogos dourados que banham seu quarto?
Tudo é uma nova descoberta.

A criança ainda muito nova
encosta a ponta de seus dedos pequeninos
na janela de seu quarto.
Abre olhos enormes e encara o sol com espanto.
Como pode ser tão forte? Como pode ser tão grande?

O presidiário vê uma fuga do sufoco.
Entra em júbilo ao ver suas grades
sendo perfuradas pela imensidão que banha seu quarto.
Ele sorri, saudoso de seu futebol na praça aos domingos.

A garota acaba de sair de um bar.
Olha para o horizonte e ri de si mesma.
Olha, já é dia... Ainda estou acordada!
Segue para a rua fazendo um meneio sensual,
chamando logo um táxi.

O menino acorda espantado,
ainda pensando nos pesadelos da noite anterior.
Alivia seu peito ao ver a luz do novo dia
raiando pela sua janela.
Nada mais de monstros, medos e fobias.

O aventureiro abre seus olhos e vê
as últimas estrelas sendo abraçadas pelos
raios vermelhos que correm livres
pelo céu que lhe serviu de leito.

O suicida mantém os olhos abertos.
Está cansado, está frenético, não encontra
meio nem começo nem fim.
Mas algo no seu peito cresce...
Talvez uma resposta indizível,
ou ainda uma nova pergunta aguçando sua mente.
Sente ele uma vontade absurda de continuar vivo
de cruzar o mundo para atingir os locais mais inóspitos
e neles abrir os olhos para mais um raiar.
Ele sente o júbilo que há muito não sentia.
Consegue pulsar em suas veias
as estrelas de que é feito. E cessa seu terror.

Lá sobe o sol.
Talvez mais tímido na metrópole,
muito mais refletido nos vidros.
Mas, ainda assim, sobe muito rápido.
Tem ele ombros fortes.
Carrega com si toda a paura
e toda a tristeza da noite.
E deixa o mundo estupefato
com o seu poder.
Busca, antes de tudo, o sentimento mais puro
preso no âmago de todos nós.
Aquele sentimento que nós mesmos esquecemos.
Uma sensação de palpitar. O doce tremer de uma lágrima.
O astro carrega em si nossas falhas
e nos dá o alimento para uma nova esperança.
Ele nos lembra de que somos humanos,
faz-nos carne.

O sol nos faz lembrar do amor.

Caio Mello
19/03/2012

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