segunda-feira, 26 de agosto de 2013

A borboleta



O cidadão honesto aguarda em frente ao portão
para entrar no prédio.
Gatunos povoam a cidade,
é preciso ter cautela.

Há um primeiro portão. Imenso.
Braços mecânicos e rangentes guardam sua abertura.
No topo do portão, seis fios paralelos correm eletricidade.
Uma placa amarela (não discreta) diz Cuidado eletricidade.
E dela nunca se saberá se a eletricidade ou o homem
é que deve ter cuidado.

Depois do portão, há uma antessala.
Se tivesse paredes claustrofóbicas,
poderia ser chamada de câmara de gás.
Mas possui apenas grades escuras.

Dentro da antessala, há um homem alto
de terno e gravata.
Ele nada diz, com um fio enrolado dentro do ouvido.

Depois da antessala, há um segundo portão.
É tão grande quanto o primeiro.
Também possui braços mecânicos.

O cidadão honesto veio apenas visitar um amigo,
provavelmente não vai demorar muito.
Uma caixa de ferro solta uma voz metálica,
colhendo dados e suspeitas.

Minutos se passam. O cidadão honesto aguarda acuado.
Enquanto ele espera, o homem repara em um miúdo ser vivo
que pousa delicadamente no chão ao seu lado.

É uma borboleta.

Ela mexe ligeiramente suas asas.
O cidadão honesto nunca estudou nada sobre borboletas,
mas ela com certeza é muito bonita.
Conforme sua asa se mexe, outros tons aparecem.
Azul, preto, cinza, amarelo, branco...

A borboleta não parece se importar com o metal.
Não parece muito preocupada com as grades.
Ela transpassa o primeiro portão.
Está dentro da antessala!
Não foi anunciada, não foi analisada,
não interfonaram para nenhum apartamento
questionando se ela realmente deveria entrar.

Que absurdo! Uma patente falha na segurança.
O homem de terno que permanece na antessala
sequer repara na borboleta.

O pequeno ser vivo voa descompromissadamente
de volta para o lado de fora.
Pousa novamente ao lado do cidadão honesto.
Ele ainda espera. Alguma coisa parece estar errada.

A borboleta, dessa vez, toma coragem
e tranpassa ambos os portões ao mesmo tempo!
Que audácia... Chega a pousar sobre as flores
que estão no jardim do pátio interno do prédio.

Ela não possui um voo possante.
Não é gavião, não é ave de rapina.
Seu voo é delicado, incerto.
Mas pequeno o suficiente para fugir das grades.

O cidadão honesto, do lado de fora das grades,
observa e inveja a borboleta colorida.

Caio Bio Mello
26/08/2013

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