segunda-feira, 9 de novembro de 2015

EleGIGANTE


Um elefante
sentado ali no canto da grama.
Perto das rosas – e por trás há tulipas de madeira.

As cores não são cores, são coisas.
Atonalizadas.

Os objetos enfileirados submergem
sob a valsa de Wagner.

Posso ouvir o som ríspido das botas
em suas rajadas metódicas.
Não posso vê-los, pois estão todos
mortos.

A morte – o fiume da vida.
Caudaloso momento e áspero viver.

Os dedos doem ao se vergarem
sofrendo no frio.

Gli elefanti sono di buona memoria.

Quatro vinte quinze. Quatro vinte quinze.
Café com pão café com pão café com pão.

Alguns olhos não se fecham. Outros, sugados pela inanição,
já perderam o brilho.

Os sapatos na beira da água. A quem pertenceram?
Não há donos no estado heroico – ataraxia obtida numa Automated Teller Machine.

As linhas de tráfego que se preenchem num voo helicoidal,
a volta do homem à Lua.
A small step for a man, a giant leap for mankind.

O corpo se encinzenta. Há algo que gruda e não mais abandona o corpo.
EleGIGANTE. Somos paquidermes bípedes desenfreados.

A cor do céu era amarela e a linha também. A linha de espera.
Enfileirados encapuzados engravatados enputecidos.

O despertencimento. Einsamkeitgeist.
Todos unidos pelo sentimento de utilização. A praticidade.
Números e filas e sequências.
O paquiderme é tímido e tem dificuldade de embarcar
na rotina diária da práxis.

Um quadro único avolumado. É possível ver um rosto esguio.
Escorre da moldura um par de braços gélidos.
Um ponto alto ilumina o mundo.

De asas abertas, a gaivota ganha a vista.
O elefante senta-se tranquilo numa sala de repouso.
Há textos também em sua língua. Para ali, o silêncio.
De lá, não se ouve o rugido. Não mais.

Lass mir ruhig.

O pensamento se eleva e se reparte.
É sempre hora de partir, o dia todo, a toda hora
e a qualquer lugar.

O paquiderme é fabuloso em seu ofício de fogo.
Assopra, assombra, assevera. Ovacionado.
Mas, de lá para a rua, já na beira do mar,
é ignoto transeunte. Sic transit gloria mundi.

As pontes se calam, os motores silenciam,
as cores desbotam.

Rostos eternizados num talkshow que
angaria fundos para biscoitos deficientes,
produzidos em dose de cacau inferior à estipulação legal.

Niente per dimenticare.
De boa memória, ele senta cansado no sol.
E dorme.

 

Caio Bio Mello
09/11/2015

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