Carlos,
se abrisses teus olhos,
serias Drummond?
Se ainda andasses,
se pudesses sentir na pele
o novo mundo que surge...
O que diria, Carlos?
Talvez o enfastiado olhar
translúcido das ruas estreitas.
Talvez a descrição minuciosa
das tantas pernas que já não de bonde andam: metrô.
Tua flor, tua náusea.
O novo tempo de homens ainda partidos.
Carlos, podes dizer de teu túmulo
que a vida continua?
Tua voz faz falta.
Tuas palavras vivem ao eterno.
Mas já não têm o mesmo timbre.
E nós, quaisquer viventes que desnorteiamo-nos,
buscamos teus dizeres.
Mas, Carlos, a vida continua besta.
As pessoas continuam com sete faces.
Também os poemas.
O que dirias do vestido na parede?
Talvez não mais fugiria de casa o pai,
quem sabe a mãe desta vez...
Não te assustes: as coisas se alteram.
E o cheiro forte da memória.
Porque de tudo resta um pouco.
A tua pedra virou mártir, o teu sol.
A tua pedra virou montanha, Carlos.
E tua colina virou Drummond,
um vulto enorme a ser gauche na vida.
O anjo, mesmo que torto,
era abençoado.
Mostrou-te tanta coisa...
Sinto saudades de um homem que nunca conheci,
que nunca sequer soube meu nome.
Meus heróis são velhos, feios, fracos.
Usam óculos e têm medo da chuva.
Meus heróis sabem muito bem ouvir o coração
e mostrar para a alma do que ela é feita.
Falam eles de tudo... Até dos leiteiros.
Os ferozes padeiros do mal.
Carlos, já lançou-se o leite longa vida.
Seria, então, talvez o carteiro?
A cidade continua no tom da aurora.
Por fim, em meus momentos lúgrubes,
petrificado pelo quotidiano banal,
deparo-me com a pergunta que nunca deixaste calar:
trouxeste a chave?
A minha poesia desdobra-se, agoniza.
Não, talvez nunca terei a chave.
Eu queria saber tanta coisa ainda....
Como faço, como busco?
Em vão tento me explicar. Os muros são surdos.
Preciso de ajuda, preciso de inspiração.
E agora, Drummond? Quando voltarás?
Caio Mello
31/10/2012
Fiz um outro dia nessa "temática". Abraço.
ResponderExcluirDrumôn,
veinho,
você me influencia,
mas diz.
me diz,
no teu íntimo
de seu ser
se não te
influencio
aqui na terra –
daqui do chão.
Leia mais: http://versodeguardanapo.blogspot.com/#ixzz2B2AoUK1A
Ígor,
ExcluirGostei muito do poema. Bem intimista.
Acho que Drumôn é um pai pra todos nós.
Abração