quinta-feira, 26 de setembro de 2013

O homem-cão



O homem-cão.
Tal qual cachorro do mato,
sempre na gangorra da vida.

Nessa ideia de comunicar sem dizer,
latindo suas vontades
e lambendo os seus desejos.

O homem-cão.
Existência repentina entre um dever e outro
de quem corre atrás de bolas
arremessadas a esmo por seu dono.

O sinônimo de posse. Pertencimento.
O fim do repente, término das surpresas.
Raia o dia, comida. Gira em círculos.
Corre, corre, corre. Não diz nada.

Ao fim do dia, o retorno para a casinha.
Sem contestar. Quando faz tudo o que querem,
o homem-cão recebe um osso.

Que presente! A tripa antiga de algo que já teve vida.
O bicho rói o seu próprio conteúdo,
sem nunca rememorar aquilo que deveria ter sido.
Põe a língua para fora, num arfar inquieto.

Também a cadela-maria. Metódica.
De rabo empinado e pelos macios.
Nesse vai-e-vém na porta de casa,
ali perto do jardim.

O homem-cão não tem pudores.
Faz suas vergonhas todas nas ruas.
Mas ninguém se importa.
Os donos catam as fezes em pequenos sacos plásticos.

Muito bem, homem-cãozinho, muito bem!
O homem-cão, quando em casa,
sabe alegremente mijar no jardim.
No máximo, ele mija no jornal.

E o dono lhe presenteia com biscoitinhos
quando o serviço é bem feito.
Triste do homem-cão...
Ele é tão fiel!
Chora de saudades quando o dono sai de casa.

Mas o próprio amor do bicho também é condicionado.
Ele ama mais quem lhe dá comida.
Alimentando-o direito, tem-se o seu amor.
Uma simples troca de vontades.

O bicho também não fica muito contente com as roupas que deve usar.
Uma casaco muito feio que incomoda o corpo.
Mas o que fazer? Os donos assim o pedem...
E todos os homens-cães andam com a mesma roupa.

Todos eles com aquilo apertado no pescoço...
Sim, enrolado por cima da gola, espremendo a jugular,
há uma coleira. Forte.
Quanto mais arisco é o animal, mais forte deve ser a coleira.

O dono prende o homem-cão. Arrasta-o para coisas muito chatas.
As coisas mais chatas do mundo. Mas o bicho não sabe falar.
Nunca lhe ensinaram palavra alguma.
Nunca lhe deram ouvidos para ver o que diz.

E os homens-cães são claramente bestas!
Animais incontroláveis que repentinamente
podem causar inúmeros problemas.
Desde objetos quebrados em casa a acidentes na rua.

Os donos têm medo, claro. É preciso respeitar os bichos.
Eles possuem dentes afiados e mandíbulas possantes.
Poderiam esmagar o dono a qualquer momento.
Então, é melhor fazer com que amem.

Amando, não sofrem. Não sofrendo, não pensam.
Assim é melhor. É mais positivo que fiquem bem quietinhos.
Mudos, para dizer a verdade. Assim, vão fazer o que lhes é dito,
vão obedecer . E nunca vão contestar o seu dono.

Caio Bio Mello
26/09/2013

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