sábado, 26 de março de 2011

Numiver

Estou preso num buraco, nesse buraco bem fundo. Estou ficando já parco esquecendo-me do mundo. Mas não foi a culpa minha nem foi erro de pensar. Esse furo aqui não tinha até a semana passar. Mas tempo mesmo não passa parece tudo pra trás sinto que a cabeça amassa, coisa que me dói demais. Mas até que tem muita coisa pra fazer, sabe... Um buraco não é lá tão ruim assim... Tem musgo, escuridão, eco. Eco é divertido, você fala e volta pro ouvido. Fala volta folta vala. Mas eu queria mesmo era encontrar alguém logo de uma vez. Já faz quanto tempo que estou aqui? Só vejo dia ir e dia voltar. O relógio marca horas, mas e daí? Sempre parece que nem me movi.

E se eu pudesse voar?
Imagina, sair pelo céu
que tristemente vejo daqui
todos os dias
sem nunca conseguir tocá-lo.

Mas será que se toca o céu?
Ele tem gosto?
Ele tem carinho?
Por que me deixou aqui então?

Calma, você tá ficando louco. Como assim sair voando? Esse buraco tá começando a afetar o que eu penso... As pessoas nunca voaram e nunca voarão. Mas será que não voam porque não querem? Será que elas mesmas limitam alguma coisa dentro de si e acabam ficando no chão? Puta merda, esse buraco tá mesmo me fazendo mal...

Mal bem bem mal
tanto faz.
Só tem eu aqui mesmo.
Posso ficar pelado,

gritar, xingar a mãe do meu vizinho pentelho
ir, voltar, mudar meu nome.
E passar fome.

Aliás, que fome.
Voar dá fome, verdade.
Ahn?

...

Voar, sim, aceitarei os fatos. Se a lógica me proíbe, há outros raciocínios que me expandem a pensar. Benpensar. Autopensar. Pensar talvez com meus próprios dizeres, minhas palavras recém construídas. Talvez através delas eu tenha mais liberdade com as coisas. Sim.

Decidi que voar, pra mim,
vai se chamar Numiver.

Quero numiver... Eu numivo.
Numiver miver nu mi ver er vuminer.

Numiver. Numiver.

Vai, esquece das coisas. Essas coisas que você levou a vida inteira e que fazem parte de você agora. Triste sina que você se fez, hein? Poxa, fica se prendendo em conceitos antigos e não consegue nem sair daqui. Tudo bem, foi antes uma fatalidade do que um erro, mas a vida é feita dessas coisa e você não pode se deixar abater por essas etupidezes que se encontram daí afrente. Poxa. Aliás, cazzo. Pega mais pesado, porra.

Numiver numiver numiver.

Eu acho que vou – não fale.
Ah. O... Seu... Mas...

Poxa, estou voando.

Caio Mello
26/03/2011

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