O tempo todo
todo o tempo.
Um pano vermelho
estendido escondido no infinito.
Eu, você, ela,
meros nós curtos de linha.
O vento bate e balançamos
ao sabor do conjunto.
Mas há objetos maiores
que o tempo.
Nosso pano tremulante
não consegue manter em si
tudo que se diz real.
Então, objetos pontiagudos
atravessam nosso plano.
E deixam grandes buracos.
Amores, medos, angústias
possuem pontas afiadas
que atravessam o tecido
sem o menor problema.
Os rombos são grandes e irreparáveis.
A linearidade é ironia
tosca
na qual cremos por inércia intelectual.
A chuva cai lentamente no meu jardim. O gramado verde é fofo. Um pequeno feixe de sol abre-se furtivo num canto de nuvem. O chão expõe um pouco de sua terra em seus pequenos detalhes. O solo é plano. Nele, caem as gotas de chuva perpendicularmente. As gotas deixam leves buracos. Quebram a lógica, furam o tempo. E, no fim, alimentam o solo com sua água.
Rala-se queijo. O queijo ralado
atravessa o cortador afiado
saborosamente
quebrando a monotonia.
Um coração doce.
Pobre alma de gente sofrida.
Bate bate bate.
Morre em segundos
pela espada que o perfura
rompendo a reta
com amores imperfeitos.
O tempo ainda é pouco.
Se fosse muito,
não teria furos.
Não há vida que seja totalmente reta.
O tempo é feito de curvas,
meandros a serem descobertos.
E de furos
(estes necessitam de especial atenção).
Aquilo que foi ainda pode ser de novo.
O que é buraco não é tempo.
O buraco é tudo e se acabou.
É agora, ontem, amanhã.
Pode voltar a ser
quando menos esperamos.
Buracos são prestativos,
aumentam no calor noturno.
As descontinuidades
chocam as vidas.
É como a luz
que penetra os olhos.
Fura ela o que vemos.
Fura em nós,
fura em tecido
fora todos detalhes.
E somos luz também.
Uma desconstrução em nós mesmos,
o próprio buraco que criamos
somos também.
Buraco, cova, antro,
covil...
Não funcionam os nomes
que damos aos furos.
Qualquer nome rude
que se dê
não exporia ele com convicção
a magnitude de nossos furos.
A eles, porventura,
poderíamos chamar
de vida.
Caio Mello
12/03/2011
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