sábado, 26 de março de 2011

Imensidão

Toda a praça estava cheia. Pessoas e mais pessoas a se perder de vista. Um povo inteiro, unido, coeso, forte. Bandeiras dançavam ao sabor do vento, crianças voavam no ombro de seus pais, rostos surgiam no meio da multidão. Todos ali, juntos. Prontos para ouvir. Serenos, como se a tarde fresca fosse um momento único numa vida inteira. Impressionante era o silêncio respeitoso que se abria naquele momento. Era uma orquestra completa aguardando ser regida.
Ele subiu no palanque. Tal qual maestro, levantou os braços com as palmas voltadas para si. Seu rosto tinha um semblante de prece, serenidade contemplativa. Ele começou:

Queridos, venho aqui dizer-lhes algos que vocês já sabem. Não trago nada novo para seus ouvidos. Já estamos juntos há muto tempo, e desde muito já sabem vocês minhas motivações. Mas o que venho pedindo e fomentando em vocês está ainda recôndito e precisa ser libertado. Eu procurei atingir em cada um essa transformação simples, porém paulatina, de abertura. O que eu trago é uma mensagem de liberdade. Somos presos por nós mesmos. Não procurem em falhas a libertação. Não procurem em lutas, nem em discursos demagógicos, nem em seus maiores medos. Vocês têm de entender a realidade como um todo coeso. Vejam como as coisas se montam em teias, em tecidos suaves que buscam a maciez. Observem o mundo. E mais: deixem-se ser observados. Só assim serão livres. O que mais limita a personalidade das pessoas é o medo. Medo de errar. Medo de perder. Medo de chorar. Mas todos choram, todos sofrem. Além disso está a capacidade de reerguer-se. Está o poder de seguir em frente mesmo com tantas adversidades. Lutem contra o medo. O medo, aliás, não fomenta somente a inércia. Ele também inibe a criação. Por favor, criem. Preciso de vocês, preciso que criem, preciso que sejam livres. O que existe dentro de nós é lindo, mas pode se perder pelo próprio raciocínio. Não pensem que são pouco. Sonhem, sonhem muito, sonhem todas as noites, sonhem durante o dia, sonhem durante o trabalho, durante o banho, durante o sexo. Lembrem-se das estrelas! Somos feitos de estrelas, de imensidão. O nosso sonho não tem fim, nossa vontade só é inibida por nós mesmos. Não se esqueçam que a liberdade não tem limites, ela volta-se para tudo e para todos. Liberdade não significa oprimir a vontade alheia para impor a sua própria. Longe disso, a liberdade mostra-nos a capacidade de sermos juntos e ao mesmo tempo. Somos livres entre nós, somos diferentes e aceitamos isso. Unidos seremos mais. Agora, há um detalhe que precisa ser ressaltado nesse momento: cuidado com o que desejam. Há certos momentos que exigem menos infinito. Limites precisam ser impostos para que não se perca a objetividade da vida. Quando as coisas começam a se unir, como um bloco homogêneo, cujo raciocínio diverge muito do mundo real, quer dizer que estamos abstraindo demais. Não fujam do mundo, não é isso que lhes peço. Pensem no mundo, vivam o mundo, respirem o mundo. Sejam terra, água, lágrimas e desejos. Entortem as coisas com seus desejos, mostrem à realidade a fraqueza da física, construam paralelismos e analogias antes impossíves de serem vistas. O intangível é a nossa meta. O que não se pode ver é o que precisa ser visto. Vejamos.

Caio Mello
26/03/2011

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