O
poeta é incapaz de conter seus sentimentos.
Está
sempre aberto ao mundo,
sempre
conectado de um modo que não pode explicar.
Não
se trata de estética, de sonoridade,
nem
de qualidade artística.
Sejam
os versos bons ou ruins,
esse
estado permanece.
É
um permanente contato com algo interior,
amarrado
às tripas e à alma.
Há
momentos nos quais o desejo é apenas pelo silêncio
e
pela serenidade.
A
vontade de conseguir fechar o vidro,
silenciar
o barulho.
Mas
isso é impossível
As
palavras, sejam feias ou belas,
elas
consomem. O corpo é enferrujado por dentro.
Antipoiesis:
o efeito deletério do eu-lírico.
É
estar sempre aprofundado nos sentimentos,
nas
ideias, ensimesmado.
A
incapacidade de permitir a ocorrência
natural
dos eventos.
Uma
inaptidão, que brota muitas vezes
à
noite, quando o poeta deixa-se deitar
para
(tentar) dormir.
São
milhões de pássaros, uma revoada,
um
rio caudaloso durante uma enchente.
Os
objetos se amontoam
em
pilhas e estantes.
A
antipoiesis é o lado sombrio
e
profano da criatividade, ignota à estética.
Ela
não é bela. Ela existe.
É
como um órgão novo no corpo,
que
afeta a respiração, a circulação e o ciclo do sono.
Mas,
por outro lado, é consequência lógica
da
poiesis. Se existe o belo, deve haver o profano.
É
natural que se pense na existência
do
terrível quando se cogita o maravilhoso.
E
esses dois mundos existem
e
se digladiam no coração pulsante,
às
vezes como rosa, outras, como guerra e sangue.
Uma
vida de extremos.
Repentes
de felicidade, rompantes de tristeza.
Um
dia de sol, outro de lua.
Por
ordem causalista,
mantém-se
o equilíbrio – e para dar-se o contraste,
devem
os extremos coexistirem
no
claustro de um mesmo peito.
Só
é capaz de descrever a alegria
quem
já vivenciou a tristeza.
Então,
é preciso respeitar a antipoiesis
e
deixá-la consumir o corpo, em pequenas doses.
As
marcas e cicatrizes são o cimento.
Somente
assim, em tal aceitação tormentosa,
ao
advento da poiesis,
terá
o poeta a capacidade
de
alcançar o lirismo mais puro e mais selvagem
que
jamais poderia sonhar.
Caio
Bio Mello
21/12/2015
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