Os
nossos heróis são descartáveis.
Não
duram mais do que um mês
nas
televisões de domingo à noite
e
depois caem na obviedade.
São
os profissionais do nada:
maior
atirador de bolas de basquete em um minuto
maior
comedor de ovos crus em dez segundos
maior
destaque de uma aptidão sem utilidade.
Cultuamos
a vida perfeita da boa-forma
e
criticamos quem trabalha demais:
para
ter saúde é bom ter a mente fresca.
Nos
espelhamos na ilustre família
dos
comerciais de margarina.
Os
pais (sempre heterossexuais) sorridentes,
nunca
preocupados com o trabalho,
podem
dedicar todo seu amor e saúde aos filhos.
Gente
muito bonita que nunca se abala pela crise.
Abafamos
nossa incompreensão
com
compras em grandes shoppings.
Cinquenta
calças podem, com toda certeza,
evaporar
qualquer lágrima.
Das
inúmeras faces que possuímos,
ostentamos
apenas uma.
Estamos
sempre felizes. Sempre!
Em
fotos, vídeos, mensagens, pensamentos.
Estar
triste, hoje, é como ter lepra.
Não
temos mais esse direito.
Ninguém
nunca chora.
E
é assim que tem que ser.
Temos
todo o direito de comer
até
nos empanturrarmos,
mas
não temos o direito de ser gordos.
Gordo?
Displicência.
Tomamos
shakes, tônicos, sucos detox.
Gastamos
dinheiro num carro,
para
dirigir até a academia e correr numa esteira.
Engolimos
um quarto de remédio antes de deitar,
só
para esfriar a cabeça...
A
metrópole faz muito barulho à noite.
Carros,
ônibus, bares. Distúrbios do sono.
Um
mês depois, meio remédio.
No
fim do ano, um inteiro para pregar os olhos.
E,
ao longo do dia, as olheiras se aprofundam
e
estamos quase apagando na mesa de reunião.
Buscamos
no
ócio do trabalho
a
labuta da arte.
E,
nos fins de semana,
nada
é divertido sem entorpecentes.
Álcool,
uma ganja, uma bala, um doce.
A
loucura é só mais um estado de existência.
Talvez
fosse bom nos perguntarmos,
um
dia, quem sabe:
como
foi mesmo que chegamos aqui?
Caio
Bio Mello
30/01/2016