terça-feira, 24 de julho de 2012

O relógio que não sabia contar as horas


E das suas engrenagens
vinha presto todo o tempo
dotado de grandes peças.
Era um rugir bem distante,

como se o mundo-relógio
fosse contar-lhe os segredos
debaixo do bater pinos.
Rudimentar mecanismo

girava bem calculado.
Passo bem antes de passo.
Perna bem antes de perna.
Ferro bem antes de ferro.

Ele, mero espectador,
não sabia o que dizer.
Não sabia o que vestia
e nem como se portava.

Bastava colocar óleo
diariamente nos olhos
e mantê-los bem abertos.
O espetáculo da vida

rodopiava depressa.
Não podia perder tempo,
nem mesmo piscar os olhos.
Cada pino, cada peça,

cada prega, cada válvula
durava bem um minuto,
depois vinha imensidão
que levava tudo embora.

Dava corda toda noite.
Dava verso todo dia.
Dava aço pele dura
Dava pluma pela sede.

Não podia fazer contas.
Batia pinos sem números
e vezes sem seus tamanhos,
tão perdido quanto cobre.

E girava sem sentido
a bater feito ponteiro
nesse tão grande relógio
que nunca soube das horas,

mas sempre pôde contar
num cálculo bem preciso,
o bater e o badalar,
o destino das pessoas.

Caio Mello
24/07/2012

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