Quanto mais
coisas ele fazia, mais na masmorra se sentia. Estava preso. Era um rato de
laboratório. O único cheiro que podia sentir era do seu próprio peido. Aquilo
ali não tinha o menor sentido. Seu cabelo era um emaranhado de loucuras
perdidas ao longo do tempo. Ele podia ver muito bem com os olhos. Mas não tinha
nada para ver. O que aparecia na sua mente eram imagens dispersas de momentos
desconexos. Podia ver o presente, o passado, o futuro, o quotidiano... Tudo o
que já fora uma vez deixava de ser.
Ser!
Tal qual verbo
perdido
as tardes nas manhãs
e o desmembramento
das velhas
por
ó
E
que se registre a falta de fé, o esbulho, o concretismo, a prolixidade, um
terno arranhando o ombro. Um ombro arranhando um terno em uma parede qualquer.
Sua bunda doía, ralada. A merda do chão frio, que merda! Já não conseguia nem
mesmo explicar para si mesmo o que conseguiria explicar para crianças de três
anos de idade. Perdia o tempo, perdia a noite, perdia o mundo!
Perdendo de si
talvez em alguém
talvez, por que não?
Se pode raiar
se pode vazar
se conta faltar.
E se ele voltasse
E se ele faltasse
E
o mais importante: e se ele realmente se perdesse onde jamais deveria ter se
perdido? Aquele fim incontestável de toda resposta que jamais deveria ter
pergunta. E se? Cabia-lhe escorrer por si mesmo, procurando uma resposta
estúpida. Afinal, ele era estúpido. Um babaca. Acreditava na palavra acima de
tudo. Acreditava no amor, na beleza das coisas. Mas o mundo parecia ser cada
vez mais quadrado.
Procurava o fim de tarde
No raiar do mesmo dia
Sem saber da meia noite
Sem saber do meio dia
Sobraram-lhe
as palavras. Mas e agora? Só tinha as palavras e nada mais. Nada! Ninguém cria,
ninguém deixava de crer, ninguém conseguia explicar o intangível. E que se
fodam as palavras escolhidas, que se fodam as obrigações! Merda de mundo!
Merda! Aquele monte de merda com o qual o povo enchia diariamente a privada.
Digo com pesar
e antes com pendor
que o mundo virou
um enorme caco
de vidro malchil
Os olhos
os olhos
os olhos
os olhos
os olhos
os olhos
solhosolhosolshosolhosols
que ele não podia esquecer jamais.
Não poderia esquecer.
Os olhos.
Os olhos eram cicatrizes profundas em sua mente. Uma
praga da berne devorando a carne ao longo da vida. Não restava mais nada. A
vida fora muito mais impactante do que realmente poderia ser possível crer. Um
raio atômico de crianças defeituosas corria pela praia num domingo.
A praga
A vala
A bala bela bola
Ele
continuava a sentir falta. Isolara-se. Malfadara-se. Consciente de seu destino,
seguia adiante. Decifra-me ou te devoro.
Devoro-te sempre
Devoro-te dia
Devoro-te nunca
Favor deixar os seus pertence na porta de metal
antes de entrar no recinto
o mau hálito pode ser vencido
procure um odontologista
Obrigado
Caio Mello
04/07/2012
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