quarta-feira, 18 de julho de 2012

Pedidos por carta


Que o mundo seja feito de belezas.
Que a vida seja leve e o dia, um regozijo.
Que o querer bem seja o bem-querer.
Que a falta de vontade seja efêmera.

Que os corpos se enlacem serenamente no fim de tarde.
Que o frio aproxime os corpos.
Que o calor extirpa as roupas dos corpos.
Que a solidão morra só.

Que as caixas de chocolate se multipliquem
Que as dores no corpo doam em si mesmas.
Que as dores da alma deixem o mundo.
Que as cicratizes esmoreçam.

Que os olhos busquem as vistas e os soslaios.
Que os papéis sejam pequenos barcos.
Que os cargueiros encham-se de rosas.
Que as rosas se multipliquem pelos campos.

Que o silêncio só anuncie-se quando for necessário.
Que a aurora seja ao meio dia e às seis horas da tarde.
Que as vistas matenhma-se abertas.
Que as mãos não se desenlacem.

Que o bem vença o mal.
Que os olhos encham-se de lágrimas.
Que as lágrimas formem um oceano!
Que a água salgada contenha boas memórias.

Que as memórias não se percam em nossas carnes.
Que as carnes nunca deixem a vida.
Que a vida nunca deixe as carnes.
Que a conjunção carnal seja um toque de divindade no mundo real.

Que o terceiro tom do despontar da manhã seja dourado.
Que a quinta estrela do Cruzeiro do Sul seja ainda mais brilhante a partir de hoje.
Que o céu inteiro ilumine-se eternamente.
Que a lua carregue um semblante de paz.

Que os guerreiros lutem pelo fim das armas.
Que as armas fiquem roucas e percam os dentes.
Que as balas amoleçam e percam a capacidade de perfurar a carne.
Que os ferimentos curem-se muito depressa.

Que os médicos tornem-se Midas da saúde.
Que os engenheiros construam sensações.
Que os arquitetos desenhem nossa alma.
Que os juízes decidam pela justiça.

Que os poetas continuem em contato com os cosmos.
Que a Via Láctea continue sempre infinita.
Que a eternidade seja resumida num só beijo.
Que o beijo dure menos de um segundo.

Que a vontade não se perca frente às obrigações.
Que a loucura revele nosso lado mais meigo.
Que as flores continuem em busca de mais cores.
Que as abelhas fabriquem mel de paixão.

Que os relógios desistam de calcular futilmente o tempo.
Que o bater das horas seja impenetrável, indizível.
Que os dias transcorram na mais perfeita insensatez.
Que as noites sempre sejam divididas a dois.

Que a união impeça que um casal se separe.
Que a ficção ganhe vida no mundo.
Que o mundo ganhe vida na ficção.
Que os sonhos sejam um mundo mais real do que o nosso.

Que possamos ver, nas estrelas, uma parte de nós mesmos.
Que os astros nos guiem pela viagem na imensidão.
Que a vida seja um abraço.
Que o afago seja uma continuidade da palma de nossas mãos.

Que as crianças finalmente ensinem os adultos a viver.
Que os adultos sejam humildes para escutar.
Que os desejos mais íntimos não sejam sufocados.
Que a liberdade impere no globo.

Que os devaneios sejam tidos como expressões.
Que o pequeno seja grande, com vistas para o intangível.
Que o avesso do verso seja o dorso de um animal.
Que a serenidade cure a pele.

Que o corpo saiba se regenerar das batalhas.
Que a dor encrustada no peito vaze como a água com detergente.
Que as mais diversas cores dominem o mundo.
Que o mundo seja fraco demais para impedir essa invasão.

Que a pele rejuvenesça.
Que os idosos tenham a chance de começar de novo.
Que a verdade seja a musa nua dos olhos do artista.
Que a Arte seja genuína.

Que a rotina seja mais genuína.
Que a reflexão abra caminho em nossos músculos.
Que o coração não dê nem mesmo sequer uma batida sem propósito.
Que o propósito constante de um coração seja de amar incondicionalmente.

Que sejamos certos de nós mesmos.
Que nós tenhamos a certeza da chuva na terceira quinta-feira do mês.
Que o mês tenha sete fins de semana.
Que a dedicação diária ao engenho seja voltada à conquista incessante da alegria.

Que se busque, no ócio do trabalho, a labuta da arte.
Que o deslumbramento nunca caia no esquecimento.
Que os ossos deixem de ser tão duros e tão enferrujados.
Que os olhos não se cansem nunca de ver.

Que o mar continue sempre imenso, com a onda necessária.
Que percebamos a importância dos nossos detalhes.
Que todos saibam se desapegar de necessidades desnecessárias.
Que possamos viver a vida sem ter de comprá-la.

Que os pedidos sejam atendidos por corações infindáveis.
Que os versos cresçam, multipliquem-se.
Que este poema nunca tenha fim,
crescendo a cada sonho adicionado por uma nuvem sem fim de sonhos libertos.

Caio Mello
18/07/2012

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